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Espiritualidade

Por que Nossa Senhora mostrou o Inferno aos Pastorinhos?

Embora ignorado pela maior parte das pessoas deste século, o inferno existe. Ele é a consequência natural de todos aqueles que escolheram o pecado e rejeitaram Deus.

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Em 1917, no contexto turbulento da Primeira Guerra Mundial, a pequena localidade de Fátima, em Portugal, tornou-se o cenário de uma das aparições marianas mais significativas na história da Igreja Católica. Três crianças pastorinhas, Lúcia dos Santos e seus primos, Francisco e Jacinta Marto, foram os protagonistas de uma série de eventos extraordinários que capturaram a atenção e a devoção do mundo católico. Estas aparições não só afirmaram a fé de muitos como também trouxeram mensagens urgentes, sendo o centro das mensagens nos chamados “três segredos”, que a Virgem confiou aos jovens videntes.

Lúcia, Francisco e Jacinta eram crianças de uma simplicidade rural, sem acesso a grande educação formal, mas profundamente enraizadas na fé católica. Suas vidas mudaram para sempre entre maio e outubro de 1917, quando afirmaram ter recebido visitas da Virgem Maria, que lhes aparecia na Cova da Iria. Nossa Senhora, a “Senhora mais brilhante que o Sol”, como descrita por Lúcia, confiou-lhes mensagens que chamavam à oração, à penitência e à conversão, fundamentais para a restauração da paz mundial e para a salvação das almas.

A Importância dos Segredos de Fátima

Os segredos revelados por Nossa Senhora durante a sua terceira aparição em 13 de julho incluem visões e profecias que abrangem desde a visão do inferno até a previsão do fim da Primeira Guerra Mundial, o advento de outra guerra sob o papado de Pio XI, e a perseguição à Igreja e ao Papa. Embora o terceiro segredo, revelado apenas no ano 2000, tenha capturado grande atenção pública e especulação devido ao seu conteúdo enigmático sobre o sofrimento da Igreja, muitas vezes, o primeiro segredo, que mostra uma visão aterradora do inferno, é menos discutido.

O Primeiro Segredo: A Visão do Inferno

Na visão relatada por Lúcia, a Virgem abre os braços dos quais sai uma intensa luz que revela aos pastorinhos:

O reflexo pareceu penetrar a terra e vimos como que um grande mar de fogo. Mergulhados em esse fogo, os demônios e as almas, como se fossem brasas transparentes e negras ou bronzeadas, com forma humana, que flutuavam no incêndio, levadas pelas chamas que delas mesmas saíam juntamente com nuvens de fumo, caindo para todos os lados, semelhante ao cair das faúlhas em os grandes [incêndios], sem peso nem equilíbrio, entre gritos e gemidos de dor e desespero que horrorizava e fazia estremecer de pavor (deveu ser ao deparar-me com esta vista que dei esse ai! que dizem ter-me ouvido). Os demônios distinguiam-se por formas horríveis e asquerosas de animais espantosos e desconhecidos, mas transparentes como negros carvões em brasa. [1]

Esta descrição não é apenas uma imagem gráfica do sofrimento, mas uma representação visceral da realidade do inferno, conforme entendido na doutrina católica. As “almas como brasas transparentes e negras ou bronzeadas” simbolizam a eternidade da pena dos que se afastam de Deus. Os “demônios distinguiam-se por formas horríveis e asquerosas de animais espantosos e desconhecidos, mas transparentes como negros carvões em brasa”, destacam a deformação do mal, que é tão contrária à ordem e à beleza da criação divina.

Esta visão do inferno revelada às crianças de Fátima serve como um lembrete sombrio e poderoso da consequência do pecado mortal e da rejeição de Deus. O fogo, frequentemente utilizado nas Escrituras para simbolizar purificação e punição, aqui é retratado como um elemento de tormento eterno, refletindo a gravidade do afastamento dos caminhos divinos.

Além do impacto visual e emocional, essa visão do inferno destaca a urgência da mensagem de Fátima sobre a necessidade de conversão e oração. Nossa Senhora mostrou às crianças essa realidade não para provocar desespero, mas para motivar a humanidade a uma mudança de vida, à prática do arrependimento e à intercessão pelos pecadores, que podem ainda evitar tal destino.  

Na cultura moderna, onde o conceito de pecado é muitas vezes minimizado ou ignorado, a mensagem de Fátima ressoa como um alerta claro. Maria, em sua bondade, não só mostrou esta visão para assustar, mas para motivar uma mudança genuína nos corações e mentes das pessoas, lembrando-os da misericórdia de Deus que está sempre disponível através da conversão.

O Inferno e a Misericórdia

Apesar de o primeiro segredo ser menos discutido, sua mensagem é crucial, e dão o contexto ao segundo (Devoção ao Imaculado Coração) e ao terceiro (Atentado ao Papa e perseguição da Igreja). Relembrar o primeiro segredo, é especialmente necessário hoje, em uma era onde o secularismo e a indiferença religiosa são prevalentes. Ora o Inferno existe e “As almas dos que morrem em estado de pecado mortal descem imediatamente, após a morte, aos infernos, onde sofrem as penas do Inferno”. [2]

É muito comum hoje falar da misericórdia de Deus, e como por isso muitos acham que o inferno não existe ou está vazio. Mas o inferno não é contraditório à misericórdia: “Deus não predestina ninguém para o Inferno. Para ter semelhante destino, é preciso haver uma aversão voluntária a Deus (pecado mortal) e persistir nela até ao fim” [3]. Nosso Senhor mesmo nos alerta que a perdição é uma realidade e que muitos vão para lá: “Entrai pela porta estreita, pois larga é a porta e espaçoso o caminho que levam à perdição e muitos são os que seguem por eles. Que estreita é a porta e apertado o caminho que levam à vida e como são poucos aqueles que os encontram!”(Mt 7, 13-14).

“Perdoai e livrai as almas todas do Inferno…”

Após a visão do primeiro segredo, Nossa Senhora explica: “Vistes o inferno, para onde vão as almas dos pobres pecadores; para as salvar, Deus quer estabelecer no mundo a devoção a Meu Imaculado Coração. Se fizerem o que Eu vos disser, salvar-se-ão muitas almas e terão paz. A guerra vai acabar”. [4]

A Virgem de Fátima enfatizou a importância do arrependimento e da oração, especialmente a recitação do terço, que ela pediu para ser rezado diariamente para a conversão dos pecadores. A prática dos Cinco Primeiros Sábados, por exemplo, foi incentivada como um meio de reparação ao Imaculado Coração de Maria, promovendo a devoção e a reflexão sobre sua vida e mensagens.

Como forma de evitar a perdição do inferno, Nossa Senhora também ressalta a importância de praticar penitências, principalmente aceitando com paciência os sofrimentos, dores, doenças e contrariedades na vida, oferecendo tudo por amor a Jesus e pela conversão dos pecadores, ela também ensina a fazer essa curta jaculatória para o oferecimento das penitências: “Ó Jesus, é por vosso amor, pela conversão dos pecadores e em reparação pelos pecados cometidos contra o Imaculado Coração de Maria” [5].

Esperança e Conversão

Esta chamada à conversão é extremamente relevante hoje, num tempo marcado por distrações materiais e esquecimento espiritual. A devoção mariana, especialmente através do terço, encoraja os fiéis a meditarem sobre os mistérios da fé e a aplicarem esses princípios em suas vidas diárias, cultivando uma relação mais profunda com Deus e uma maior sensibilidade às necessidades dos outros. E o convite a oração pela conversão dos pecadores e sua associação com a paz mostra nossa responsabilidade como cristãos de rezar por todos e em especial por nossa própria conversão.

As aparições de Fátima, particularmente a visão do inferno revelada no primeiro segredo, são um lembrete pungente da compaixão de Maria por seus filhos e da realidade das consequências eternas do pecado. Enquanto o mundo moderno continua a lutar com as mesmas questões de guerra, paz e moralidade que eram pertinentes em 1917, as mensagens de Fátima permanecem um farol de esperança e um chamado à ação. Este é o momento para a Igreja e seus fiéis reacenderem a devoção a Nossa Senhora, atentando profundamente às suas advertências e ao seu chamado à conversão, para que muitos sejam salvos e a paz possa finalmente prevalecer no mundo para o triunfo do Imaculado Coração de Maria.

Referências

[1] Memórias da Irmã Lúcia I. 14.ª ed. Fátima: Secretariado dos Pastorinhos, 2010, p. 176 (IV Memória)

[2] Catecismo da Igreja Católica n. 1035

[3] Idem n. 1037

[4] Memórias da Irmã Lúcia I. 14.ª ed. Fátima: Secretariado dos Pastorinhos, 2010, p. 176 (IV Memória)

[5] Idem p. 177