Doutrina

As Obras de Misericórdia e nossa vida espiritual

As obras de misericórdia, sejam elas corporais ou espirituais, são um verdadeiro caminho de santidade.

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A Igreja nos ensina que, se a fé estiver viva em nós, daremos muitos frutos. Não é possível crer em Jesus Cristo e fechar os olhos ou os ouvidos para o sofrimento dos irmãos. A verdadeira fé nos conduz à comunhão.  

A Igreja, como mãe, caminha com os que caminham. Onde o mundo vê ameaça, ela vê filhos; onde se erguem muros, ela constrói pontes. [1]  

É por isso que devemos observar com cuidado quais são as consequências práticas de nossa fé para a vida dos mais próximos, sobretudo dos necessitados. Como enxergamos a dor do outro? Esse é um exame de consciência necessário para todos nós!

Assim também a fé: se não se traduz em ações, por si só está morta. (Tg 2, 17)

Nem todos darão os mesmos frutos, mas algum fruto temos que dar.  Em sua bondade e sabedoria, a Igreja vem em nosso auxílio, propondo-nos uma lista de boas obras para que possamos avaliar o nosso compromisso concreto com as exigências da fé. Não se trata de um dever frio e seco, mas de uma expressão do nosso amor.

Você já sabe do que estamos falando?  Essas ações de caridade são chamadas de “obras de misericórdia”, que se destinam a atender necessidades do corpo e da alma.  Conhecê-las uma a uma ajuda-nos a organizar as prioridades de nossa ação.

As obras de misericórdia são as ações caritativas pelas quais socorremos o próximo em suas necessidades corporais e espirituais. [2]

Neste artigo, nós vamos meditar sobre as obras de misericórdia. Começaremos falando sobre a esmola, que tem sido mal vista por alguns. Em seguida, abordaremos outras obras corporais de misericórdia. Depois, será a vez de meditarmos sobre as obras espirituais. Vamos, enfim, destacar uma delas para conhecermos mais de perto o tema. Por fim, você encontrará sugestões para sua oração pessoal.

Dando esmolas

Hoje em dia dar esmola aos pobres não anda em alta. Há pessoas que chegam a criticar abertamente quem auxilia os pedintes nas ruas. Por mais que cada caso seja um caso, o fato é que não podemos ignorar que dar esmolas agrada muito a Deus.

Dentre esses gestos de misericórdia, a esmola dada aos pobres é um dos principais testemunhos de caridade fraterna. É também uma prática de justiça que agrada a Deus. [3]

Jesus não proibiu ninguém de distribuir esmolas. Muito pelo contrário! O Senhor apresentou um critério para que as esmolas fossem doadas com mérito espiritual. Nós não devemos fazer da caridade um espetáculo de vaidade.

Quando deres esmola, não saiba a tua mão esquerda o que faz a direita, de modo que tua esmola fique em segredo. E teu Pai, que vê o que está em segredo, te retribuirá. (Mt 6, 3-4).

Doar esmolas aos pobres é uma forma muito elevada de caridade, mas existem outros modos de expressar o amor de Cristo em nossa vida concreta. Seja qual for a carência do irmão, geralmente nós podemos aproximarmo-nos dele para aliviar o seu sofrimento.

Obras Corporais

A alimentação é uma condição fundamental para que nós possamos sobreviver. Quem não precisa comer e beber? Talvez por isso essa necessidade venha logo à mente quando pensamos em qual obra de misericórdia corporal já praticamos.

Muitos passam fome e sede bem próximo de nós. Você percebe que há pessoas tão sofridas assim por perto? Tenha cuidado para não ser indiferente. Nós seremos julgados pela nossa disponibilidade para com a penúria do outro.

Eu tive fome e me deste de comer;  estava com sede, e me destes de beber (Mt 25, 35b)

O Senhor Jesus nos falou da importância de dividirmos a nossa vida com quem sofre. Não podemos viver fechados em nossos interesses. Há, por exemplo, pessoas que não têm o que vestir; outras até têm roupas, mas padecem de graves doenças ou se encontram privadas da liberdade civil.  Nós devemos nos interessar por elas.

Eu era forasteiro, e me recebestes em casa; estava nu, e me vestistes; doente, e cuidaste de mim; na prisão, e viestes até mim. (Mt 25, 35c-36)

“Eu era”: essa é uma afirmação do próprio Senhor. Significa que Jesus se une aos sofrimentos de todos os desesperados. Ele vive, por amor, as dores de cada pessoa humana em Sua própria carne.

Jesus se identifica com todos os homens, especialmente os pobres e aflitos. Portanto, ao servir o próximo, nós servimos a Cristo: ao realizar obras de misericórdia, esperamos encontrar misericórdia (Tg 2, 1-13). [4]

Quem são as pessoas que o Senhor Jesus confiou aos seus cuidados? Sempre há alguém que precisa de nosso olhar, de nosso carinho e até de alguns bens. Hoje é um bom dia para fazer um gesto concreto por elas.

Então, para recapitular, são sete as obras de misericórdia corporais:

  1. Dar de comer a que tem fome
  2. Dar de beber a quem tem sede
  3. Dar pousada aos peregrinos
  4. Vestir os nus
  5. Visitar os enfermos
  6. Visitar os presos
  7. Enterrar os mortos

Obras Espirituais

Quando pensamos em cuidar do próximo, nós não devemos ater-nos ao zelo pelas necessidades materiais. Embora elas sejam importantes, a vida possui demandas que são de natureza estritamente espiritual.

Ao longo dos séculos, a Igreja sempre foi sensível às duas ordens de necessidades — corporal e espiritual. O caso, por exemplo, dos mosteiros beneditinos é exemplar. Os monges de São Bento sempre entenderam que o ser humano é uma unidade.

Além da assistência material, os mosteiros desempenharam um papel fundamental na formação cultural e espiritual dos mais humildes. Em tempos de peste, guerra e fome, eram lugares onde o necessitado encontrava pão e remédio, mas também dignidade e palavra. [5]

Não só o corpo, mas também a alma devem ser amparados. Pretender dissociar o corpo da alma fere a dignidade humana, pois somos uma unidade. A natureza humana une em si a ordem material (corpo) e espiritual (alma).

Se o homem aspira a ser somente espírito e quer rejeitar a carne como uma herança apenas animalesca, então espírito e corpo perdem a sua dignidade. E se ele, por outro lado, renega o espírito e consequentemente considera a matéria, o corpo, como realidade exclusiva, perde igualmente a sua grandeza. [6]

É preciso praticar obras espirituais de misericórdia! Basta olhar para a própria alma para entender por que ela não pode ser esquecida em nossa caridade. Que seria de nós, se ninguém nos ensinasse os caminhos de Deus? É por isso que não podemos deixar de instruir e aconselhar. Recordemo-nos destas palavras que o Senhor disse:

Ensinai-os a observar tudo o que eu vos mandei. (Mt 28, 20a)

Falar de Deus para quem não conhece a Sua beleza é uma obra de amor, mas também é importante fazer-se presente na vida dos irmãos que já estão no Senhor. Muitas vezes, por exemplo, nós nos esquecemos de consolar e confortar os sofridos de nossa paróquia ou de nossa casa.

Consolai-vos e edificai-vos uns aos outros. (1Ts 5, 11)

Perdoando o próximo

As obras de misericórdia atravessam toda a vida cristã. Até mesmo no mais íntimo de nosso coração ressoam as exigências do Evangelho. Somos chamados a ter misericórdia, para recebermos misericórdia. É neste ponto que chegamos ao perdão.

Recusando-nos a perdoar nossos irmãos e irmãs, nosso coração se fecha, sua dureza o torna impermeável ao amor misericordioso do Pai. [7]

Você sabia que perdoar as ofensas é uma das obras espirituais de misericórdia? Todos nós vivemos de perdão em perdão, como o filho pródigo (Lc 15, 11-21). É justo estarmos sempre dispostos a perdoar e a suportar o próximo.

Cada um de nós é um filho pródigo de Deus. Saímos de casa, e esbanjamos todos os dons que nosso Pai tem derramado sobre nós. Nas nossas escolhas, preferimos as seduções de uma terra estrangeira ao amor e liberdade que as crianças gostam da casa de seus pais. Tudo isso acontece porque pecamos. [8]

O perdão, além disso, cria relacionamentos de amor e confiança. É interessante observar que, quando São Paulo admoestou os colossenses a perdoarem-se uns aos outros, relacionou este perdão ao perdão que Cristo nos concedeu. Nele, somos um só corpo.

Suportai-vos uns aos outros e, se um tiver motivo de queixa contra o outro, perdoai-vos mutuamente. Como o Senhor vos perdoou, fazei assim também vós. (Cl 2, 13)

Um caminho de santidade

As obras de misericórdia, sejam elas corporais ou espirituais, são um verdadeiro caminho de santidade a seguir. Se forem feitas por amor a Cristo, com maturidade na fé, elas vão unindo-nos mais e mais ao Senhor.

Quais obras de misericórdia estão ausentes em sua vida? E em quais você se sente mais confortável? Leve essas questões para a sua oração pessoal. Se sentir necessidade, converse com um sacerdote.

Então para concluir, vamos recordar as sete obras de misericórdia espirituais:

  1. Ensinar os ignorantes
  2. Dar bom conselho
  3. Corrigir os que erram
  4. Perdoar as injúrias
  5. Consolar os tristes
  6. Sofrer com paciência as fraquezas do nosso próximo
  7. Rezar a Deus por vivos e defuntos

Que Nossa Senhora nos ajude a ser mais caridosos com o próximo e amá-los como Jesus nos pediu.

Referências

[1] Papa Leão XIV. Exortação Apostólica Dilexi Te, 75.

[2] Catecismo da Igreja Católica, 2447.

[3] Ibid.

[4] Scott Hahn & Curtis Mitch. O Evangelho de São Mateus: Cadernos de Estudo Bíblico. Campinas, SP: Ecclesia, 2014. p. 127.

[5] Papa Leão XIV. Dilexi Te, 57.

[6] Papa Bento XVI. Deus Caritas Est, 5.

[7] Catecismo da Igreja Católica, 2840.

[8] Scott Hahn. Senhor, Tende Piedade. 3ª Edição. Lorena, SP: Cléofas, 2018  p. 110.