Não sabemos quando será a última quaresma de nossa vida. Talvez seja esta, a de 2025. Somente Deus conhece este mistério. Você já meditou sobre essa realidade? Um dia nós vamos entregar a alma a Deus.
Tu és pó, e ao pó hás de voltar. (Gn 3, 19b)
Não devemos nos assustar. A meditação sobre a nossa fraqueza não deve nos conduzir ao desespero; pelo contrário, ela nos recorda que Deus é bom. O Senhor nos criou e quer o nosso bem. É por amor que Ele concede tempo para nós acolhermos a graça.
No entardecer da vida, seremos julgados pelo amor. [1]
A quaresma é uma graça de valor inestimável. Ela nos recorda do essencial, que é a nossa salvação. Mas será que nós estamos aproveitando bem esse tempo?
Em outro texto, nós meditamos sobre qual penitência fazer na quaresma. Hoje convém meditar sobre a urgência de fazer bem esta quaresma, que pode ser a última de nossa vida.
Cinzas, Penitência e Misericórdia
Na liturgia da Quarta-Feira de Cinzas, o sacerdote abençoa as cinzas. Em seguida, os fiéis recebem-nas em suas testas, como sinal de conversão. As cinzas são um símbolo da penitência interior.
O ato de impor as cinzas simboliza a fragilidade e mortalidade, bem como a necessidade de ser redimido pela misericórdia de Deus. Longe de ser um ato meramente exterior, a Igreja manteve o uso das cinzas para simbolizar a atitude de penitência interior a que todos os batizados são chamados durante a quaresma. [2]
No Antigo Testamento, há um Livro que se chama Profecia de Joel. Ele nos ajuda a compreender o sentido da penitência. Por meio do profeta, Deus nos pede um coração aberto à conversão.
“Agora, diz o Senhor, voltai para mim com todo o vosso coração, com jejuns, lágrimas e gemidos.” (Jl 2, 12)
As penitências que fazemos não são práticas meramente exteriores. Elas devem brotar do coração. Sem o desejo de conversão do coração, as penitências exteriores se tornam estéreis e até enganadoras.
A penitência interior é uma reorientação radical de toda a vida, um retorno, uma conversão para Deus de todo nosso coração, uma ruptura com o pecado, uma aversão ao mal e repugnância às más obras que cometemos. [3]
Examine o seu coração. Quando você encontrar coisas que não agradam a Deus, não se desespere nem se surpreenda. Agradeça ao Senhor pela consciência que lhe deu: conhecer as próprias misérias é uma graça!

Mas é preciso dar um passo a mais. Não basta se reconhecer pecador; Deus nos convida a amar. Como poderemos amar, se não voltarmos a Ele com todo o coração? O Papa Bento XVI nos ajuda a entender o que significa retornar ao Senhor:
Começo por sublinhar a expressão «de todo o coração», que significa a partir do centro dos nossos pensamentos e sentimentos, a partir das raízes das nossas decisões, escolhas e acções, com um gesto de liberdade total e radical. Mas, este regresso a Deus é possível? Sim, porque há uma força que não habita no nosso coração, mas emana do próprio coração de Deus. É a força da sua misericórdia. [4]
A confiança na misericórdia do Pai deve crescer em nós ao longo das práticas quaresmais. É muito oportuno meditar sobre a parábola do filho pródigo (Lc 15, 11-32). Com ela, Jesus nos ensinou muito sobre o amor misericordioso do Pai.
Só o coração de Cristo, que conhece as profundezas do amor do Pai, pôde revelar-nos o abismo de sua misericórdia de uma maneira tão simples e bela. [5]
Com a certeza da divina misericórdia, nós podemos agora meditar um pouco sobre a morte.
A Quarta-feira de Cinzas e a Morte
Existem pessoas que, de tão enlouquecidas, não pensam na morte. Para elas, apenas a vida material importa. Vivem para comer, beber, passear e trabalhar. Porém, cedo ou tarde, elas vão ter que prestar contas a Deus.
O nosso procedimento deve ser bem diferente. Nós sabemos que vamos ser julgados, mas sabemos também que Deus é digno de ser amado. A nossa vida deve ser dedicada a amar ao Senhor Deus sobre todas as coisas.
Os insensatos, que não creem na vida futura, estimulam-se com o pensamento da morte a passarem bem a vida. De maneira bem diferente devemos nós proceder, os que sabemos pela fé que a alma sobrevive ao corpo. [6]
Esta quaresma pode ser a última da nossa vida. Talvez o Senhor nos chame ao longo deste ano, como já chamou a muitos nos anos passados. Não devemos nos assustar. Um dia partiremos para a Eternidade mesmo.

Você sabia que há uma longa tradição na Igreja de preparação para a morte? Quando nós rezamos a Ave-Maria, por exemplo, pedimos que Nossa Senhora interceda por nós na hora da nossa morte.
A Igreja nos encoraja à preparação da hora de nossa morte. [7]
Um dia a nossa hora vai chegar. Levando a morte a sério desde já, nós aprendemos a valorizar as escolhas que fazemos ao longo da vida. Podemos também nos arrepender, pedir perdão e fazer penitência.
A participação ativa na quaresma é um meio de preparar o coração para o momento final de nossa morte. Nós não devemos desperdiçar este tempo de graças e conversão!
A Mensagem do Papa
Em sua mensagem para a quaresma deste ano de 2025, o Papa Francisco propôs à Igreja algumas reflexões para que o nosso coração esteja bem firme no Senhor. O tema é “caminhar juntos na Esperança”.
Vejamos os três pontos:
1. Caminhar
O papa nos recorda que a nossa vida deve ser uma caminhada para o Céu. Ao longo dos anos nós passamos por muitos riscos, como o risco de esquecer de Deus. Por isso, é bom levar para a oração pessoal estas perguntas:
Estou realmente a caminho ou estou paralisado, estático, com medo e sem esperança, acomodado na minha zona de conforto? Busco caminhos de conversão das situações de pecado e falta de dignidade? [8]
2. Juntos
Vivemos em um tempo em que muitos querem se fechar nos próprios interesses. Não é esse o nosso caminho. A nossa caminhada é sempre na Igreja. O papa nos convida a valorizar a vida da Igreja.
Os cristãos são chamados a percorrer o caminho em conjunto, jamais como viajantes solitários. O Espírito Santo impele-nos a sair de nós mesmos para ir ao encontro de Deus e dos nossos irmãos, e nunca a fechar-nos em nós mesmos. [9]
3. Esperança
Você já percebeu que o mundo passa por uma crise profunda? Muitas pessoas perderam a esperança porque já não creem mais em Deus. Precisamos ter uma experiência profunda com Cristo para podermos levar a Sua luz aos irmãos. Para nos ajudar, o papa nos propõe estas perguntas:
Estou convicto de que Deus me perdoa os pecados? Ou comporto-me como se me pudesse salvar sozinho? Aspiro à salvação e peço a ajuda de Deus para a receber?
A determinação de mudar de vida
A quaresma é um tempo forte de conversão. É a hora de sermos fiéis, buscando mudar de vida. A Igreja nos ensina que são três as principais armas deste combate espiritual:
A penitência interior do cristão pode ter expressões bem variadas. A escritura e os padres insistem principalmente em três formas: o jejum, a oração e a esmola. [10]
Busquem, com discernimento, praticar as obras quaresmais. Sempre que possível, consulte o seu confessor para evitar extravagâncias. Rezemos sempre uns pelos outros.
Referências:
[1] São João da Cruz. Avisos y Sentencias 57: Biblioteca Mística Carmelitana, v. 13, Burgos, 1931, p. 238. In: Catecismo da Igreja Católica. Parágrafo 1022.
[2] Diretório sobre a piedade popular e a Liturgia, 125.
[3] Catecismo da Igreja Católica, 1431.
[4] Papa Bento XVI Homilia da Missa de Quarta-Feira de Cinzas. 13 de fevereiro de 2013.
[5] Catecismo da Igreja Católica, 1439.
[6] Santo Afonso Maria de Ligório. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa, Inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 288-290.
[7] Catecismo da Igreja Católica, 1014.
[8] Mensagem do Santo Padre Francisco para a Quaresma de 2025.
[9] Ibid.
[10] Catecismo da Igreja Católica, 1434.