Sofrimento
Espiritualidade

Como podemos evitar o Purgatório?

A busca por uma vida em união com Deus, purificada das faltas e apegos é o que melhor nos garante evitar os sofrimentos purificadores após a morte.

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No mês de novembro somos convidados a meditar sobre as realidades do purgatório. Conforme a Igreja ensina, as almas que estão no Purgatório, embora salvas, não estão ainda completamente purificadas para ver a Deus face a face. Elas precisam passar por um processo que envolve sofrimentos lancinantes, pois:

Quem será digno de subir ao monte do Senhor? Ou de permanecer no seu lugar santo? O que tem as mãos limpas e o coração puro, cujo espírito não busca as vaidades (Sl 23, 3-4)

Os principais sofrimentos do Purgatório

O primeiro e mais doloroso desses sofrimentos é o afastamento temporário de Deus. A alma, criada para unir-se a Ele, experimenta uma angústia intensa com essa separação provisória. Para facilitar nossa compreensão, podemos comparar esse afastamento, em um grau incomparavelmente maior, à experiência de uma sede excruciante, quase insuportável. No Purgatório, essa sede é, na verdade, a sede pelo próprio Deus.

Além do afastamento de Deus, outro sofrimento intenso é a memória torturante do tempo perdido e das faltas cometidas em vida. Mesmo as pequenas faltas, muitas vezes negligenciadas por nós, são recordadas pela alma em uma nitidez dolorosa. Esses pecados, que talvez parecessem insignificantes em vida, assumem uma gravidade tremenda diante da santidade de Deus. A alma percebe claramente as consequências de cada ação e cada omissão, e essa consciência torna-se fonte de aflição, arrependimento e desejo de justiça.

O Fogo Purificador do Espírito Santo: Justiça e Amor

A purificação do Purgatório é descrita muitas vezes como um fogo, não físico, mas espiritual, que queima o que há de impuro na alma. O Espírito Santo, como chama divina, atua sobre a alma, consumindo todas as impurezas e, ao mesmo tempo, aumentando o desejo ardente de união com Deus.

São Paulo, na primeira carta aos Coríntios, usa essa mesma metáfora do fogo para falar da purificação das almas:

(...) se a obra de alguém for consumida, ele sofrerá perda, mas será salvo, como quem passa através do fogo (1Cor 3, 15).

São Paulo nos ensina que, ao término desta vida, os amigos de Deus, servos de Cristo, que ainda não tenham purificado completamente suas obras do amor próprio e, naturalmente, dos pecados (leves), serão salvos, mas precisarão passar por um processo de purificação realizado pelo Espírito Santo. Assim, o fogo do Espírito transformará em cinzas tudo o que ainda precisa morrer na alma, e transformará em chama de amor tudo o que deve crescer para unir a alma a Deus.

Essa ação do Espírito Santo é essencialmente amorosa, mas, paradoxalmente, traz sofrimento. A alma é purificada pela ação desse fogo divino que consome o que ainda a separa de Deus, ou seja, suas imperfeições e apegos. Esse fogo é, ao mesmo tempo, um fogo de justiça e de misericórdia, que age para que a alma esteja plenamente purificada para a visão beatífica.

O que podemos fazer nesta vida para evitar o Purgatório?

À luz de tudo o que a Igreja e os Santos, pela vontade de Deus, nos revelam sobre o Purgatório, é natural que desperte em nós um desejo ainda maior de ir diretamente para o Céu. Veremos a seguir algumas práticas que podemos adotar nesta vida para diminuir ou mesmo evitar o Purgatório; são movimentos internos e externos que visam alcançar a santificação e a purificação de nossas faltas antes da morte:

  1. Estar em constante Estado de Graça

Permanecer em estado de graça é essencial para a vida espiritual. O pecado mortal, que nos separa da graça santificante de Deus, deve ser evitado a todo custo, e, caso ocorra, é indispensável buscar, com urgência, o Sacramento da Reconciliação.

Para estar em estado de graça, é essencial manter uma vida em conformidade com os mandamentos divinos, pois qualquer transgressão dos Dez Mandamentos rompe a comunhão com Deus e nos precipita na condenação.

Esses mandamentos, revelados pelo Senhor, são o alicerce da nossa conduta moral; permanecer fiel a eles é o caminho para preservar a integridade espiritual e cultivar uma verdadeira amizade com Deus. A observância desses preceitos vai além de uma simples obediência às regras, de um “pode ou não pode”; seguir os mandamentos é uma expressão viva de amor e reverência a Deus, que nos chama continuamente a uma vida de santidade.

  1. Comungar com frequência e fervorosamente

A Eucaristia é o próprio Cristo ressuscitado, e a comunhão eucarística nos permite experimentar Seu toque físico e espiritual. Com seu caráter purificador, a Eucaristia nos limpa dos pecados veniais, ordena nossos afetos e desejos, fortalece-nos contra as tentações futuras e nos une mais profundamente ao Cordeiro de Deus, que se entrega como vítima de amor. Aqui está a vocação de todo batizado: ser uma vítima de amor unida a Cristo. A Eucaristia nos configura a tão grande missão.

É realmente impressionante o que acontece quando, além do domingo, recebemos o Senhor com maior amor. Ao comungar com constância e fervor, somos cada vez mais acolhidos pelo amor redentor de Jesus, que, ao se doar na hóstia consagrada, nos configura a Ele em Sua perfeita oblação.

Essa união transforma nossa alma, moldando-nos em Seu amor imolado e conformando-nos cada vez mais à Sua semelhança, para que possamos viver e agir mais perfeitamente, segundo o modelo de Seu sacrifício. Por isso, é muito importante estar bem preparado para comungar, e depois da comunhão fazer uma frutuosa ação de graças permanecendo na presença do Senhor tanto quanto podemos.

  1. Devoção a Nossa Senhora

A devoção a Nossa Senhora é uma via segura para evitar o Purgatório. Ela é a “onipotência suplicante”, como vimos nas Bodas Caná. Maria intercede por seus filhos com o amor materno, obtendo graças de crescimento nas virtudes.

Além disso, no convívio orante, Nossa Senhora nos ensina a oferecer nossas obras e sofrimentos em união ao sacrifício de Cristo — exatamente como ela fez na Via Sacra e no monte Calvário.

Destacamos, em especial, a devoção a Nossa Senhora do Carmo. O uso do escapulário é um sinal visível de consagração e confiança em Maria. Para as almas que vivem fielmente essa devoção, Nossa Senhora prometeu interceder para que alcancem o Céu no primeiro sábado após a morte.

Esse privilégio, sustentado pela prática de oração, penitência e vida sacramental, demonstra o cuidado materno de Nossa Senhora em ajudar as almas devotas a alcançarem a união plena com Deus, seja já nesta vida ou, mais rapidamente, no Purgatório.

  1. Aproveitar as Indulgências concedidas pela Igreja

As indulgências são preciosos dons oferecidos pela Igreja. A prática das indulgências, especialmente da indulgência plenária, é um meio eficaz de evitar ou reduzir a purificação no Purgatório, pois apagam as penas temporais dos pecados.

A importância de fazer bom uso das indulgências é ilustrada por um episódio da vida de Santa Teresa d’Ávila. A grande mística relatou uma visão em que viu uma freira de sua ordem religiosa já no Céu. Espantada — pois a freira não era conhecida por grande fervor —, Santa Teresa perguntou a Jesus como aquela alma havia deixado o Purgatório tão rapidamente. Jesus respondeu: “Ela soube aproveitar bem as indulgências que a Santa Igreja lhe concedia.”

Esse episódio nos ensina que, ao longo de sua vida, a religiosa utilizou com fé e diligência as graças das indulgências oferecidas pela Igreja, alcançando uma purificação mais breve e uma entrada rápida no Céu.

  1. Devoção aos Santos Anjos

A devoção aos Santos Anjos, especialmente ao Anjo da Guarda, nos ajuda a viver uma vida mais santa e protegida contra o pecado. Os Anjos são grandes protetores e guias em nossa peregrinação espiritual, e sua presença e ministério nos fortalecem diante das tentações.

Adoradores e fiéis servos de Deus, os Santos Anjos desejam a realização da vontade divina, que é a nossa salvação e rápida entrada no Céu. Nossos Anjos da Guarda, além de nos ampararem nesta vida, continuarão a nos auxiliar no Purgatório, intercedendo por nós até que estejamos definitivamente na presença de Deus.

Peçamos constantemente o auxílio dos Santos Anjos, sobretudo nas provações, para nos mantermos na graça de Deus, aumentando a caridade em nossas almas e, consequentemente, evitando o Purgatório.

  1. Obras de Misericórdia (Corporais e Espirituais)

As obras de misericórdia — espirituais e corporais — são atos de caridade que ajudam a expiar nossas faltas e a cooperar com as graças que Deus nos infunde. Como ensina a Sagrada Escritura, “a caridade cobre uma multidão de pecados” (1Pe 4, 8).

A prática da caridade, especialmente com os necessitados, purifica a alma, aproximando-a de Deus. As obras de misericórdia são:

Corporais:

1) Dar de comer a que tem fome

2) Dar de beber a quem tem sede

3) Dar pousada aos peregrinos

4) Vestir os nus

5) Visitar os enfermos

6) Visitar os presos

7) Enterrar os mortos

Espirituais:

1) Ensinar os ignorantes

2) Dar bom conselho

3) Corrigir os que erram

4) Perdoar as injúrias

5) Consolar os tristes

6) Sofrer com paciência as fraquezas do nosso próximo

7) Rezar a Deus por vivos e defuntos

As Obras de Misericórdia nos fazem semelhantes a Cristo, e sua prática constante é um meio seguro para a plena santificação nesta vida — ou que nos ajudará após a morte, diminuindo a purificação necessária.  

  1. Oferecer cada sofrimento em reparação pelos pecados

Oferecer a Deus nossos sofrimentos e contrariedades como reparação pelos pecados nos permite participar de forma especial na redenção de Cristo, como São Paulo expressa:

Completo na minha carne o que falta aos sofrimentos de Cristo, pelo seu corpo, que é a Igreja (Cl 1, 24).

Cada pequeno sacrifício, quando oferecido a Deus com amor, contribui para a purificação da alma, podendo diminuir ou até mesmo evitar a necessidade do Purgatório. Assumir nossos sofrimentos com humildade e oferecê-los como reparação é um ato que purifica a alma, unindo-a ainda mais a Cristo.

  1. Rezar pelas almas do Purgatório

A oração pelas almas do Purgatório é um belíssimo ato de caridade espiritual. Ao rezarmos por essas almas, pedimos a Deus que apresse sua purificação e as conduza à visão beatífica. Essa prática de oração pelos falecidos nos lembra de nossa própria fragilidade e da possível necessidade de auxílio após a morte. Deus, em Sua infinita misericórdia, certamente recompensará aqueles que, com amor e devoção, rezam pelas almas do Purgatório.

O amor a Deus deve ser maior que o medo do Purgatório

Cada uma dessas práticas é um meio concreto de buscar a santidade ainda nesta vida, reduzindo ou eliminando a necessidade do Purgatório. Contudo, é importante vivê-las por amor a Deus, um amor cada vez mais intenso e generoso, e não por um medo do que podemos passar no futuro.

A busca por uma vida em união com Deus, purificada das faltas e apegos, é uma vida de liberdade e o único caminho para evitar os sofrimentos purificadores após a morte, permitindo-nos “possuir” Deus sem demora.

Esforcemo-nos para evitar o Purgatório, não por medo de seu fogo purificador, mas por um amor ardente que nos faz desejar estar rapidamente e plenamente com Deus. Vivamos de modo santo, confiando na misericórdia divina e nos meios que Ele nos oferece através da Igreja.

Que nosso desejo pelo Céu seja sempre maior que o temor das justas e misericordiosas penas do Purgatório!

Que as almas do purgatório, pela misericórdia divina, descansem em paz. Amém!