O reinado de Jesus Cristo é uma certeza da fé cristã. A crença de que Ele é o Rei do Universo se fundamenta na doutrina que O proclama como “primogênito de toda criação” e “primogênito de uma multidão de irmãos” (cf. Cl 1, 15-20 e Rm 8, 29).
Ao longo de Sua missão redentora, Cristo revelou-se não apenas como Salvador, mas como Aquele que reconcilia e recapitula toda a criação em Si mesmo. Ele é a plenitude da criação e o começo de uma nova humanidade, chamada a participar da vida divina.
Esta realeza divina encontra expressão no caráter absoluto de Cristo para a redenção e, nele, a restauração da humanidade e do cosmos, onde tudo convergirá em Deus. A seguir, veremos mais aspectos da realeza do Senhor.
Por que Jesus é o Rei do Universo?
A compreensão de Jesus como Rei do Universo vem, especialmente, da passagem de Colossenses:
Ele é a imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação, pois por meio dele foram criadas todas as coisas nos céus e na terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, soberanias, principados ou poderes; tudo foi criado por ele e para ele (Cl 1, 15-17).
Esta passagem ilumina a centralidade de Cristo não apenas na redenção, mas na criação em si. Ele, que é o primeiro a ressuscitar dos mortos, inaugura uma nova criação, simbolizando o início de uma humanidade redimida.
Cristo ressuscitado é a cabeça de toda nova humanidade; Ele recapitula em Si mesmo todas as coisas, elevando a criação ao seu destino pleno em Deus. A missão de Cristo, que abrange Sua encarnação, Morte e Ressurreição (que compreende também a vinda do Espírito Santo em Pentecostes), é o ato de recapitulação que restaura e redime a criação inteira.
Esse papel de “primogênito” denota que Ele não apenas participa da criação, mas é sua fonte e finalidade. Ele é o alfa e o ômega. A realeza de Cristo como Rei do Universo é, portanto, a culminação da história da salvação.
Cristo como Cabeça da Igreja
A Escritura afirma, em Efésios (1, 22-23), que Deus “colocou todas as coisas debaixo de seus pés e o deu como cabeça sobre todas as coisas à Igreja, que é o seu corpo, a plenitude daquele que a tudo preenche em todos”.
Essa passagem descreve a união de Cristo com a Igreja, na qual Ele atua como Cabeça. Sendo o “primogênito de uma multidão de irmãos” (Rm 8, 29), Jesus não apenas governa a Igreja, mas vive nela, unindo, pelo Espírito Santo, todos os fiéis em Seu Corpo Místico.
Essa unidade entre Cristo e a Igreja enfatiza a importância de estarmos unidos a Ele. A Igreja não é meramente uma instituição; ela é, antes, o Corpo de Cristo, onde Ele é a Cabeça que conduz. Como um organismo espiritual, a Igreja participa da missão de Cristo, tornando visível Seu reinado no mundo.
O Reinado Social de Cristo
Enquanto aguardamos a segunda vinda de Cristo, já experimentamos em parte o Seu reinado, conhecido como reinado social de Jesus Cristo. Embora o cumprimento total desse reino se dê com os “novos céus e nova terra” (Ap 21, 1), há uma manifestação parcial do reinado de Cristo na sociedade através da presença ativa dos fiéis, ou seja, nossa.
O reinado social de Cristo é aquele que transforma as estruturas sociais, culturais e espirituais à luz do Evangelho. Este reinado é, portanto, uma antecipação da plenitude do Reino. Enquanto cristãos, somos chamados a implementar, em primeiro lugar, o amor a Cristo e, consequentemente, os valores de justiça, paz, caridade e dignidade humana, que refletem o próprio Cristo.
A palavra do Evangelho, efetivamente, não deve somente ser ouvida, mas também posta em prática (cf. Mt 7, 24; Lc 6, 46-47; Jo 14, 21.23-24; Tg 1, 22): a coerência nos comportamentos manifesta a adesão do crente e não se restringe ao âmbito estritamente eclesial e espiritual, mas abarca o homem em todo o seu viver e segundo todas as suas responsabilidades.[1]
Esse reinado social sempre estará presente onde o Evangelho é vivido e anunciado. A missão de cada cristão é, então, levar os ensinamentos de Cristo a todas as esferas da sociedade. Por exemplo, você pode amar a Jesus e viver os valores do Evangelho no convívio com sua família, em seu trabalho, nos lugares de lazer, nos ambientes políticos, etc.
O Reino inaugurado por Cristo aperfeiçoa a bondade originária da criação e da atividade humana, comprometida pelo pecado. Liberado do mal e reintroduzido na comunhão com Deus, cada homem pode continuar a obra de Jesus, com a ajuda do Seu Espírito: fazer justiça aos pobres, resgatar os oprimidos, consolar os aflitos, buscar ativamente uma nova ordem social (...) Quando isto acontece, o Reino de Deus se faz já presente sobre esta terra, embora não lhe pertença. Nisto encontrarão finalmente cumprimento as promessas dos Profetas.[2]
Aspectos do Reinado Social de Cristo
Como vimos, o reinado social de Cristo pode se manifestar de diversas maneiras: pela justiça, em atos de caridade, na promoção da paz e na luta pela dignidade humana. A justiça divina, por exemplo, abrange a justiça humana, pois a lei de Deus sempre promove o respeito à dignidade de cada pessoa como imagem e semelhança de Deus. A caridade é outra expressão belíssima deste reinado, pois o amor ao próximo é a vivência prática da fé:
Assim como o corpo sem o espírito está morto, assim também a fé sem obras é morta (Tg 2, 26).
Os sacramentos são instrumentos fundamentais para esse reinado, pois conferem a graça necessária para nós, católicos, vivermos configurados a Cristo, isto é, agindo como Ele agia.
O fiel leigo é discípulo de Cristo a partir dos sacramentos e em força destes, em virtude de tudo quanto Deus operou nele imprimindo-lhe a própria imagem do Seu Filho, Jesus Cristo. Deste dom divino de graça, e não de concessões humanas, nasce o tríplice «munus» (dom e dever), que qualifica o leigo como profeta, sacerdote e rei, segundo a sua índole secular. [3]
Não podemos nos esquecer também que a evangelização é uma expressão do reinado de Cristo, pois permite que a mensagem do Reino de Deus alcance aqueles que ainda não O conhecem. Quanto mais Cristo for conhecido verdadeiramente quem Ele é — Deus e homem perfeito, Salvador do gênero humano — e quanto mais Ele for amado, mais Deus e Seu Amor serão soberanos no mundo. Somente dessa forma, o reinado social de Cristo impulsionará uma profunda transformação espiritual e social.
Com a pregação do Evangelho, a graça dos sacramentos e a experiência da comunhão fraterna, a Igreja sana e eleva a dignidade da pessoa humana, «firmando a coesão da sociedade e dando à atividade diária dos homens um sentido e um significado mais profundos». No plano das dinâmicas históricas concretas, não se pode compreender o advento do Reino de Deus na perspectiva de uma organização social, econômica e política definida e definitiva. Ele é antes testemunhado pelo progresso de uma sociabilidade humana que é para os homens fermento de realização integral, de justiça e de solidariedade, na abertura ao Transcendente como termo referencial para a própria definitiva e plena realização pessoal.[4]
Doutrina Social da Igreja
A Doutrina Social da Igreja é uma resposta ao chamado do reinado de Cristo no mundo. A “Rerum Novarum”, “Quadragesimo Anno” e “Centesimus Annus”, por exemplo, são alguns dos documentos que apresentam como a doutrina social se relaciona e se atualiza com a vida cotidiana e com a responsabilidade social dos cristãos.
Esses documentos evidenciam a importância de construir uma sociedade justa, onde o amor de Cristo seja a medida de todas as ações e decisões. Assim, a Doutrina Social é uma extensão da compreensão do reinado social de Cristo, buscando aplicar Seus ensinamentos de forma concreta às realidades e desafios das questões sociais.
Jesus, Rei das Nações
Uma observação importante é a de que Jesus não é apenas o rei de cada pessoa e de todas as criaturas, mas também o Rei das Nações. A Igreja é chamada a proclamar a realeza de Cristo em todas as nações, acima de qualquer autoridade terrena. Em Mateus 28, 19, Jesus ordena aos discípulos: “Ide e fazei discípulos de todas as nações”, evidenciando que Seu reinado é universal, compreendendo todo o globo.
A missão da Igreja é fazer com que todos os povos reconheçam a soberania de Cristo, independentemente de cultura ou tradição. A mensagem de Cristo, Deus feito homem, transcende as fronteiras humanas, unindo nações e culturas na fé em um único Senhor. O reinado de Cristo, portanto, exige o testemunho constante da Igreja em todas as partes do mundo, proclamando que Cristo é o verdadeiro Rei das Nações.
A Igreja tem o direito de ser para o homem mestra de verdades da fé: da verdade não só do dogma, mas também da moral que dimana da mesma natureza humana e do Evangelho. [5]
O Cordeiro e o Livro da Vida
O Apocalipse nos oferece uma visão poderosa de Cristo como o Cordeiro que detém a história em Suas mãos. Em Apocalipse 5, vemos que Jesus é o único digno de abrir o Livro da Vida, um símbolo de Sua autoridade sobre a vida e a história. O Cordeiro que foi sacrificado é também o Rei, e Sua realeza é manifestada no poder de abrir o livro e revelar os juízos de Deus.
Essa visão do Cordeiro soberano traz esperança a nós, lembrando-nos de que Cristo já é o Rei. Apesar de muitas vezes ficarmos desesperançosos com o mundo de tantas injustiças e tragédias, Nosso Senhor é quem governa a história e conduz a humanidade ao cumprimento do plano divino de salvação. A história está em Suas mãos. Devemos viver sempre sob a soberania do Senhor Jesus, confiantes de que Ele triunfará sobre o mal e estabelecerá Seu reino eterno.
Tenhamos fé de que o reinado de Cristo, além de ser uma garantia futura, é uma realidade presente, que abrange todas as dimensões da existência. Ele nos chama a viver como cidadãos de Seu Reino, transformando nossas vidas e a sociedade à luz de Seu Evangelho.
A nossa missão é a de sempre reconhecer Cristo como Rei soberano e participar ativamente de Seu reinado por meio da santificação pessoal e do testemunho no mundo, pela fé e com obras. Que todos nós, no tempo e na eternidade, possamos glorificar o Rei do Universo, Jesus Cristo, que conduz toda a criação à plenitude da vida em Deus.
Enquanto isso, nós, como Igreja, movidos pelo Espírito, clamamos com fé e esperança: Vem, Senhor Jesus! Venha definitivamente ser o Rei do universo! (cf. Ap 22, 17).
Referências:
[1] Compêndio da Doutrina Social da Igreja. Nº 70.
[2] Ibid. Nº 325.
[3] Ibid. Nº 542.
[4] Ibid. Nº 51.
[5] Compêndio da Doutrina Social da Igreja. Nº 70.