A participação na Missa dominical não é apenas uma piedosa recomendação, mas um preceito importante da Igreja, que tem sua base nos Dez Mandamentos, no Novo Testamento e na própria Tradição Apostólica.
Desde os tempos dos Apóstolos, o domingo é considerado o “dia do Senhor”, quando somos chamados a renovar nossa aliança com Deus. Ao participar da Eucaristia, que é o coração de toda vida cristã, entramos em comunhão íntima com Cristo imolado e ressuscitado, que Se oferece uma vez mais ao Pai e a nós no sacramento, renovando o sacrifício redentor.
Quando desprezamos voluntariamente a Missa dominical sem um motivo justo, cometemos um pecado mortal, pois rompemos nossa comunhão com Deus em um ato deliberado de ingratidão pelo sacrifício e ressurreição do Senhor. A ausência deliberada na Missa representa, assim, uma falta grave em reconhecer a centralidade de Deus em nossa vida.
Para voltarmos a comungar dignamente após esse pecado mortal (isto é, o pecado que mata a vida divina da nossa alma), é necessário nos reconciliarmos com Deus por meio do sacramento da penitência. Somente através da confissão sincera e do arrependimento podemos restaurar a graça perdida e, assim, participar plenamente da Eucaristia, renovando nossa aliança com o Senhor.
Do Sábado ao Domingo: a mudança do dia do Senhor
No Antigo Testamento, o sábado era o dia reservado para o descanso e para a adoração a Deus. Este mandamento recordava o ato da criação, pois Deus descansou no sétimo dia, abençoando-o e santificando-o (cf. Gênesis 2, 2-3).
Contudo, com a vinda de Cristo e a nova e eterna aliança por Seu sangue, ocorreu uma mudança significativa. O dia do Senhor passou a ser o domingo, o “primeiro dia da semana”, em referência à Ressurreição de Jesus.
Esta mudança foi reconhecida e institucionalizada pela Igreja primitiva. Passagens do Novo Testamento atestam que os primeiros discípulos se reuniam para “partir o pão” e para a coleta de ofertas no domingo, em vez do sábado:
No primeiro dia da semana, estando nós reunidos para partir o pão, Paulo, que havia de viajar no dia seguinte, conversava com os discípulos e prolongou a palestra até a meia-noite (Atos dos Apóstolos 20, 7)
No primeiro dia da semana, cada um de vós ponha de parte o que tiver podido poupar, para que não esperem a minha chegada para fazer as coletas (1Coríntios 16, 2)
Além disso, o Evangelho de São João (20, 19) relata que Jesus apareceu aos Seus discípulos no domingo, após a Sua Ressurreição, trazendo, assim, a grande novidade da Nova Aliança: a vitória da vida sobre a morte, o triunfo da obra da redenção superior à da criação. O livro do Apocalipse (1, 10) também faz referência ao “dia do Senhor”, que desde o período apostólico foi identificado com o domingo.
Os discípulos de Emaús e a Missa dominical
A passagem dos discípulos de Emaús (São Lucas 24, 13-35) oferece um belo paralelo com a Missa dominical. Assim como Jesus, ao caminhar com os discípulos no domingo, explicou-lhes as Escrituras e abriu seus corações para a verdade oculta nelas, na Missa temos a Liturgia da Palavra, quando ouvimos a proclamação das Escrituras e recebemos a explicação por meio da homilia. Esse momento prepara e aquece nossos corações para reconhecer e receber a presença sacramental de Cristo.
Da mesma forma, no momento em que Jesus “partiu o pão”, os discípulos de Emaús finalmente O reconheceram como o Senhor ressuscitado. Esse gesto é refletido na Liturgia Eucarística, quando Cristo Se oferece a nós no pão e no vinho consagrados.
A Missa dominical, portanto, nos conduz pelo mesmo caminho dos discípulos de Emaús: primeiro, somos nutridos espiritualmente pela Palavra, e depois, nossos olhos se abrem para a presença real de Cristo ressuscitado na Eucaristia, onde, pela comunhão dominical, somos nutridos não só pela graça, mas também pelo próprio Autor da graça.
Além das Escrituras, a Tradição Apostólica
Confirmando as Escrituras, a Tradição Apostólica também reforça o domingo como o dia do Senhor. Os primeiros Padres da Igreja, como Santo Inácio de Antioquia e São Justino Mártir, atestam que os cristãos, desde os tempos apostólicos, guardavam o domingo como o dia de culto, em honra à Ressurreição de Cristo, para a celebração da Eucaristia, para a oração e a comunhão entre irmãos, diferenciando-se do sábado judaico.
Essa prática foi transmitida e preservada pelas gerações seguintes, tornando-se uma norma na Igreja, definida pelo Magistério iluminado pelo Espírito Santo. Santo Inácio de Antioquia, um dos primeiros Padres da Igreja e discípulo do apóstolo João, menciona o domingo em sua carta aos magnésios:
Aqueles que viveram de acordo com as antigas práticas agora atingiram uma nova esperança. Eles já não guardam o sábado, mas o Dia do Senhor, no qual também nossa vida foi ressuscitada por Ele e pela Sua morte. [1]
São Justino Mártir, um dos primeiros apologistas cristãos do século II, também escreveu sobre a prática dos cristãos de se reunirem no domingo. Vejam como é impressionante a semelhança da Missa – preservada até hoje –, contendo a mesma estrutura:
No dia que se chama do sol [domingo], celebra-se uma reunião de todos os que moram nas cidades ou nos campos, e aí se leem, enquanto o tempo o permite, as Memórias dos apóstolos [Novo Testamento] ou os escritos dos profetas [Antigo Testamento]. Quando o leitor termina, o presidente faz uma exortação e convite para imitarmos esses belos exemplos. Em seguida, levantamo-nos todos juntos e elevamos nossas preces. Depois de terminadas, como já dissemos, oferece-se pão, vinho e água, e o presidente, conforme suas forças, faz igualmente subir a Deus suas preces e ações de graças e todo o povo exclama, dizendo: “Amém”. Vem depois a distribuição e participação feita a cada um dos alimentos consagrados pela ação de graças (...) Celebramos essa reunião geral no dia do sol [domingo], porque foi o primeiro dia em que Deus, transformando as trevas e a matéria, fez o mundo, e também o dia em que Jesus Cristo, nosso Salvador, ressuscitou dos mortos. Com efeito, sabe-se que o crucificaram um dia antes do dia de Saturno [sábado] e no dia seguinte ao de Saturno, que é o dia do Sol, ele apareceu a seus apóstolos e discípulos, e nos ensinou essas mesmas doutrinas que estamos expondo para vosso exame. [2]
Os Dez Mandamentos e a Nova Aliança
Os Dez Mandamentos, dados a Moisés no Monte Sinai, refletem as exigências básicas da justiça, da obediência e do amor que o ser humano deve a Deus e ao próximo. Eles resumem a Lei divina, que é a norma objetiva de moralidade. Desrespeitar qualquer um dos mandamentos é, então, uma rejeição consciente e deliberada da lei de Deus, rompendo o relacionamento de aliança com Ele.
Com a Nova Aliança em Cristo Jesus, os Dez Mandamentos ganharam uma nova roupagem, mais profunda e bela. Em vez de serem apenas normas externas de conduta, eles agora revelam o começo do caminho para o amor perfeito, a santidade. Nosso Senhor não veio abolir a Lei, mas levá-la à plenitude, mostrando que os mandamentos não se limitam à observância exterior, mas são uma chamada à transformação interior e à vivência da caridade, que é o cumprimento pleno da Lei.
Por exemplo, no Antigo Testamento, o sexto mandamento ordenava “não cometer adultério”, limitando-se a proibir a infidelidade conjugal. Em Cristo, porém, esse mandamento foi ampliado e aprofundado, ensinando que a pureza não se restringe a atos externos, mas abrange também os pensamentos e intenções do coração.
Jesus declara (em São Mateus 5, 28) que qualquer desejo impuro ou olhar com luxúria já constitui pecado grave, pois trata o outro como objeto de gratificação sexual, desrespeitando a dignidade humana e o sentido profundo da sexualidade.
Da mesma forma, o dia dedicado ao Senhor também ganhou uma nova dimensão na Nova Aliança. Para o povo do Antigo Testamento, o terceiro mandamento referia-se ao sábado, o dia consagrado ao Senhor criador, um memorial do descanso de Deus após a criação. No entanto, com a Nova Aliança em Cristo, esse mandamento foi elevado e ampliado. Agora, o culto perfeito a Deus é prestado no domingo, o dia da Ressurreição do Senhor, o dia da obra da redenção, da vitória da Vida sobre a morte. Guardar o domingo e os dias santos de preceito é, portanto, a lei que responde liturgicamente ao amor redentor de Deus.
A celebração da criação, longe de ser anulada, é aprofundada em perspectiva cristocêntrica, ou seja, à luz do desígnio divino de «recapitular em Cristo todas as coisas que há no Céu e na Terra» (Ef 1,10). E ao memorial da libertação realizada no êxodo, é-lhe conferido também sentido pleno, tornando-se memorial da redenção universal operada por Cristo morto e ressuscitado. Portanto, mais do que uma «substituição» do sábado, o domingo constitui a sua perfeita realização e, de certa forma, o seu desenvolvimento e plena expressão no caminho da história da salvação, que tem o seu ponto culminante em Cristo. [3]
O Magistério da Igreja, intérprete autorizado por Cristo (cf. São João 16, 13), continua a ensinar com clareza toda a verdade sobre a Lei do Senhor, convidando os fiéis a viverem de acordo com seus mandamentos. Nos dois exemplos mencionados acima, a Igreja chama os cristãos a praticarem a castidade, como um sinal de amor e respeito pela dignidade do corpo, conforme o plano de Deus, e a guardarem o domingo como o verdadeiro dia do Senhor na nova e eterna aliança, celebrando a Ressurreição de Cristo e o sacrifício redentor que Ele ofereceu por nós.
A lista dos Dez Mandamentos
Aqui está a lista dos Dez Mandamentos, atualizada pela Igreja na Nova Aliança, com base nos textos de Êxodo 20, 2-17 e Deuteronômio 5, 6-21. Vale destacar que essa ordenação dos preceitos (de 1 a 10) segue uma hierarquia de gravidade em caso de desobediência, aparecendo primeiro os mandamentos mais centrais à nossa relação com Deus e ao próximo:
- Amar a Deus sobre todas as coisas
- Não tomar o nome de Deus em vão
- Guardar domingos e festas de guarda
- Honrar pai e mãe
- Não matar
- Não pecar contra a castidade
- Não roubar
- Não levantar falso testemunho
- Não desejar a mulher do próximo
- Não cobiçar as coisas alheias
Faltar a Missa de domingo é um pecado grave (mortal)?
Sim, é um pecado grave. O Catecismo nos ensina, em harmonia com as Escrituras e a Tradição, que “o Domingo é o dia por excelência da assembleia litúrgica” [4]. Mais à frente, o preceito é explicado:
A Eucaristia dominical fundamenta e sanciona toda a prática cristã. É por isso que os fiéis têm obrigação de participar na Eucaristia nos dias de preceito, a menos que estejam justificados, por motivo sério (por exemplo, doença, obrigação de cuidar de crianças de peito) ou dispensados pelo seu pastor. Os que deliberadamente faltam a esta obrigação cometem um pecado grave. [5]
O Catecismo também ensina que, para que um pecado seja mortal, três condições precisam ser satisfeitas: a matéria grave, plena consciência do mal e o consentimento deliberado. [6]
Como os Dez Mandamentos tratam de matérias graves, como a adoração a Deus, o respeito à vida, à verdade e à justiça, violá-los de maneira consciente e voluntária constitui um pecado mortal. Esse tipo de pecado separa a pessoa de Deus, privando-a da graça santificante, que é necessária para a vida eterna.
Portanto, descumprir qualquer dos dez mandamentos implica um afastamento radical de Deus, colocando a alma em risco de condenação, a menos que haja arrependimento e reconciliação, especialmente por meio do sacramento da confissão.
Este mandamento, que exige a santificação do domingo e a participação na Missa, é um preceito que deve ser encarado com seriedade, pois está diretamente relacionado ao destino de nossa alma no juízo diante de Deus. Não se trata apenas de uma obrigação formal, mas de um chamado amoroso à comunhão com o Senhor.
Pontualidade e plena participação na Missa dominical
Outro aspecto importante sobre a participação na Missa dominical é a pontualidade. Chegar atrasado à Missa pode comprometer, a depender dos motivos e da reincidência, a validade da participação, pois a celebração da Eucaristia é um todo integrado.
É verdade que o Código de Direito Canônico não emite orientações específicas sobre o atraso na Missa dominical e o recebimento da Santa Eucaristia; no entanto, gostaríamos de propor aqui uma reflexão, com o objetivo de encorajar os fiéis que, por negligência ou mau hábito, costumam chegar atrasados às celebrações eucarísticas.
Imagine alguém que se esforça para não perder um voo: programa-se com antecedência, arruma todos os documentos, prepara as malas, escolhe cuidadosamente as roupas e garante que tudo esteja pronto no horário. Essa pessoa entende a importância de chegar a tempo no aeroporto, pois sabe que o voo não espera.
Agora, pense na pessoa que é negligente com o horário da Missa, que chega atrasada e comparece de maneira desleixada, sem a devida preparação. O que é mais importante: estar pontual para uma viagem ou chegar na hora para encontrar Jesus na Eucaristia? Comparado com o zelo que dedicamos aos compromissos terrenos, não deveria ser ainda maior nosso zelo quando se trata de encontrar o próprio Deus?
A pontualidade na Missa é um sinal de respeito e reverência pelo sacrifício de Cristo, e refletir sobre o valor desse encontro pode nos inspirar a participar da liturgia com mais atenção e amor. Afinal, estamos nos apresentando diante do Senhor que nos redimiu, e esse encontro merece nossa máxima entrega e preparação.
Cumpro o preceito ao assistir à Missa de sábado à tarde/noite?
Um ponto pastoral importante na vida da Igreja é a possibilidade de participar da Missa vespertina de sábado. O Código de Direito Canônico de 1983 formalizou essa prática, afirmando que a participação na Missa celebrada na tarde do dia antecedente satisfaz o preceito dominical. [7]
Essa flexibilização permite que os fiéis, por motivos de necessidade, possam participar da Eucaristia no sábado à tarde ou à noite, e essa celebração cumpre plenamente o dever de celebrar o “dia do Senhor”. No entanto, o que deveria ser uma exceção tem sido adotado por muitos como um hábito regular, com o objetivo de ter o “domingo livre” para o lazer, como frequentemente ouvimos as pessoas dizerem.
Isso pode indicar uma falta de compreensão do verdadeiro sentido do domingo, e não apenas um dia livre de compromissos. A flexibilização existe apenas para casos de real necessidade ou impossibilidade de comparecer à igreja no domingo.
São João Paulo II, na Carta Apostólica Dies Domini, lembra que o domingo não é apenas o dia de assistir à Santa Missa, mas também um dia de descanso e dedicação à caridade, à oração e à família. Citando São Paulo VI, ele enfatiza que o domingo é o dia da alegria no Senhor:
Não existe qualquer oposição entre a alegria cristã e as verdadeiras alegrias humanas. Pelo contrário, estas ficam enaltecidas e encontram o seu fundamento último precisamente na alegria de Cristo glorificado (cf. At 2, 24-31), imagem perfeita e revelação do homem segundo o desígnio de Deus. Na sua Exortação Apostólica sobre a alegria cristã, o meu venerado predecessor Paulo VI escreveu que, «por essência, a alegria cristã é participação espiritual na alegria insondável, conjuntamente divina e humana, que está no coração de Jesus Cristo glorificado». E o referido Sumo Pontífice concluía a sua Exortação pedindo que, no dia do Senhor, a Igreja testemunhasse vigorosamente a alegria experimentada pelos Apóstolos, quando viram o Senhor na tarde do dia de Páscoa. Por isso, convidava os Pastores a insistirem «na fidelidade dos batizados à celebração, com alegria, da Eucaristia dominical. Como poderiam eles, de fato, negligenciar este encontro, este banquete que Cristo nos prepara com o seu amor? Que a participação em tal celebração seja, ao mesmo tempo, digna e festiva! É Cristo, crucificado e glorificado, que passa entre os seus discípulos para conduzi-los todos juntos, consigo, na renovação da sua Ressurreição. É o ápice, aqui neste mundo, da Aliança de amor entre Deus e o seu povo: sinal e fonte de alegria cristã, preparação para a Festa eterna». Nesta perspectiva de fé, o domingo cristão é verdadeiramente um «fazer festa», um dia dado por Deus ao homem para o seu pleno crescimento humano e espiritual. [8]
Como já sinalizamos, a Missa de sábado à tarde é uma concessão pastoral e litúrgica para aqueles que, por motivos justos, não podem participar da Eucaristia no domingo propriamente dito. Contudo, a prioridade é que o fiel dedique o domingo inteiro ao Senhor. Portanto, mesmo que a Missa de sábado à noite seja válida, a total santificação do domingo continua sendo uma prática central na vida de todo cristão.
Lembrem-se, amados irmãos, não há descanso maior e não há lazer melhor do que estar inteiramente no Senhor, especialmente no dia da semana consagrado a Ele e a Seu amor.
“Antes morrer que pecar”
Como vimos, faltar à Missa aos domingos sem um motivo legítimo vai muito além de uma simples negligência de um preceito da Igreja. No fundo, essa ausência revela um ato de desobediência grave pela falta de amor à Santíssima Trindade, que nos convida, a cada domingo, ao encontro pessoal e comunitário no mistério da fé: a renovação do Santo Sacrifício de Cristo.
Precisamos levar a sério o que Deus nos revela, bem como o testemunho dos santos. Os santos estavam dispostos a morrer para não desobedecer a um único mandamento. Repitamos, então, a frase que o jovem São Domingos Sávio escreveu no dia de sua primeira comunhão: “Antes morrer que pecar!”.
Que possamos cultivar esse mesmo compromisso de obediência e amor ao Pai, que nos deu e nos dá tudo pela morte e ressurreição de Seu Filho encarnado, na força do Espírito Santo.
Domingo à Missa não podemos faltar!
Referências
[1] Santo Inácio de Antioquia. Carta aos Magnésios. nº 9.
[2] São Justino Mártir. Apologia I. Capítulo 67.
[3] São João Paulo II. Carta apostólica Dies Domini. Nº 59.
[4] CIC 1167.
[5] CIC 2181.
[6] CIC 1857.
[7] Código de Direito Canônico. Cân. 1248 — § 1.
[8] São João Paulo II. Carta apostólica Dies Domini. nº 58.