A Palavra de Deus ensina, com toda clareza, que nós somos assediados por inimigos espirituais. Por meio de imagens fortes, somos alertados do perigo de viver uma vida espiritual ociosa.
Hoje vamos meditar sobre o modo como o Maligno procura arrastar-nos ao inferno. Primeiro, vamos conhecer melhor as características dos nossos adversários espirituais. Depois, vamos estudar três sinais da atuação demoníaca: a mentira; a inutilidade; e as trevas. Em seguida, vamos deixar uma sugestão prática.
Anjos Caídos
Em todo combate espiritual, convém conhecer contra quem lutamos. Os demônios são seres espirituais, dotados de inteligência e vontade. Justamente por serem livres, deliberaram entre dois caminhos opostos: obedecer ou desobedecer a Deus.
O Diabo e outros demônios foram por Deus criados bons em sua natureza, mas se tornaram maus por sua própria iniciativa. [1]
Não é exagero dizer que eles são malignos. Os demônios têm pleno conhecimento do mal que causam e atuam com toda vontade para provocar cada vez mais caos no mundo. Eles se rebelaram contra Deus e detestam a todos nós, humanos.
A Escritura fala de um pecado desses anjos (2Pd 2, 4). Esta “queda” consiste na opção livre desses espíritos criados, que rejeitaram radical e irrevogavelmente a Deus e seu Reino. [2]
Você sabia que os demônios foram criados como anjos? De modo semelhante aos homens, que, por serem livres, escolhem tornar-se bons ou maus, os anjos tiveram que decidir seu caminho. Chamamos de santos anjos aqueles que se mantiveram fiéis a Deus, como São Miguel Arcanjo. Eles são bons e combatem os outros, que se tornaram perversos por culpa própria. Um demônio é, portanto, um anjo que se rebelou contra Deus.
Houve então um combate no céu: Miguel e seus anjos combateram o dragão, e o dragão combateu junto com seus anjos. Ele, porém, foi derrotado, e eles perderam seu lugar no céu. (Ap 12, 7-8)
Esse dragão é o diabo, nosso maior inimigo (Ap 12, 9). Ele age com os outros demônios, sob suas ordens, para tentar nos conduzir ao inferno. Hoje em dia algumas pessoas duvidam da existência do inferno, mas ele existe. Não se deixe enganar!
O Inferno designa, propriamente falando, o estado dos condenados, dos demônios e dos homens mortos em pecado moral, que são eternamente punidos. [3]
Vimos até aqui que os demônios são seres espirituais perversos. Estamos em combate espiritual. Veremos agora de qual modo o demônio geralmente nos ataca.
Sinais do Maligno
O diabo está sempre ao nosso redor. Ele lança sugestões, pensamentos para nos convencer a seguir o seu caminho maldito. Basta um pecado mortal para que a alma caia sob o poder do Maligno.
Os demônios, embora não possam acessar diretamente a nossa mente e os nossos pensamentos, nos sugerem muitas ocasiões para pecar. Eles nos observam dia e noite, conhecem nossos hábitos, nossos defeitos, os pecados recorrentes, conhecem nossas preferências, enfim, eles são astutos e como uma fera sanguinária procuram todas as formas para nos atacar.
Sede sóbrios e vigiai. O vosso adversário, o diabo, vos rodeia como um leão a rugir, procurando a quem devorar. (1Pd 5, 8)
Nós não o vemos, mas existem sinais da sua atividade entre nós. Apresentaremos alguns a seguir. Não se trata de regras infalíveis, mas de um conjunto de referências para você discernir melhor na oração o que acontece ao seu redor.
1. A mentira
Mentir é característico do demônio. O Senhor Jesus chegou a chamá-lo de “pai da mentira”, deixando muito claro que o caminho da mentira afasta o homem de Deus. Devemos ficar alertas quando somos tentados a mentir para “solucionar” um problema.
Quando ele fala mentira, fala o que é próprio dele, pois ele é mentiroso e pai da mentira. (Jo 8, 44)
Mas o que é a mentira? Trata-se de falar ou fazer algo contrário à verdade, com a intenção de induzir uma pessoa ao erro. Ela fere o relacionamento entre os homens, mas também o relacionamento dos homens com Deus. Uma coisa é falar algo errado por ignorância da verdade; outra é mentir.

Mentir é falar ou agir contra a verdade para induzir em erro. Ferindo a relação do homem com a verdade e com o próximo, a mentira ofende a relação fundante do homem e de sua palavra com o Senhor. [4]
O demônio também tenta nos seduzir mentindo. Muitas vezes propõe-nos pensamentos incompatíveis com a fé católica, dando a entender que seriam sábios e prudentes, para que nós consintamos com eles.
Assalta-nos abertamente quando nos mete na cabeça pensamentos contra a fé, ou contra o sentir unânime dos Santos Doutores, quando nos sugere máximas pouco conformes à grandeza da divina misericórdia ou da divina providência, para abater nosso espírito. [5]
Nesse caso, o ataque é direto. Em certo sentido, talvez seja mais fácil para o confessor descobrir que se trata de uma ação diabólica. Mesmo assim, o combate é dramático. Não são poucas as pessoas que acabam concordando com ideias esdrúxulas, contrárias à fé da Igreja, como a de “reencarnação”.
Não existe “reencarnação” depois da morte. [6]
Há casos em que o diabo se esconde para atacar. Chega a falar algumas verdades, com o intuito de transmitir mentiras junto às verdades. É que, se dissesse apenas mentiras, todos iriam descobrir com facilidade.
Diz-nos coisas verdadeiras, santas e conformes à doutrina da fé e da moral cristã, mas com o desígnio de mesclar entre muitas verdades alguma mentira, ou para granjear-se, com o verdadeiro alguma credibilidade, para nos iludir finalmente com a falsidade. [7]
Tenhamos cuidado com as ideias estranhas que nos ocorrem, sobretudo com as modas. Nem tudo que circula no mundo é tão bom e verdadeiro como parece.
2. A Inutilidade
Tudo que vem de Deus possui valor para as nossas vidas, ainda que nem sempre compreendamos logo. Não podemos dizer o mesmo do que vem do Maligno. Ele propõe todo tipo de preocupação estéril.
O espírito diabólico, ao contrário do divino, sugere coisas inúteis, efêmeras e impertinentes. [8]
A inutilidade é um meio para provocar distrações nas almas. Cheia de ideias inúteis na cabeça, a pessoa não se ocupa do que deve ocupar-se e acaba desviando os olhos do Senhor. Não é raro, por exemplo, que nós gastemos um tempo precioso observando os defeitos dos irmãos, ao invés de rezar pela santificação pessoal deles.
O demônio, quando não encontra modo de insinuar-se com a falsidade e a mentira, acaba, por não sofrer vergonhosa repulsa, valendo-se de outra arte maligna; procura dar alimento ao entendimento com pensamentos inúteis, para que, ocupado com estes, não se empenhe nos pensamentos santos e proveitosos. [9]
Eis uma sedução astuciosa! Ao invés de escutar o que o Senhor nos pede, ficamos voltados para nós mesmos. Enquanto isso, o tempo da nossa conversão vai passando. Lembremo-nos de que, em Sua bondade, o Senhor nos pediu vigilância e oração.
Vigiai e orai, para não cairdes em tentação. (Mt 26, 41)
Além da mentira e da inutilidade, ainda há uma outra cilada que o inimigo prepara para nós. É o que veremos a seguir.
3. As Trevas
Um sinal da presença diabólica são as trevas com que ele ofusca a mente da pessoa atacada. Nesse caso, trata-se de um ataque direto à alma humana. Ele transmite uma confusão mental e grande angústia à pessoa atacada.
Deixa na mente trevas ou falsa luz. O demônio não só é pai da mentira, mas também das trevas; e por isso, quando investe contra nós abertamente, faz o que é próprio à sua natureza, e produz em nossa mente trevas, obscuridade e escuridão. [10]
Mas é possível que o demônio dissimule suas trevas. Ele pode esconder-se por trás de uma luz falsa, que é despertada na imaginação humana para gerar um bem-estar meramente emocional. Em seguida, o inimigo tenta conduzir a alma à maldade e à perturbação.
Todo o efeito desta luz falsa se reduz a um certo bem-estar nos sentidos internos, que é todo corporal, todo superficial, e sem qualquer sinal de genuína espiritualidade. E depois, ao fim, este mesmo bem-estar, deleite corpóreo, vai desaguar em iniquidade e perturbação. [11]
Nem todo bem-estar na oração é um ataque diabólico. Tenhamos cuidado para não confundir a luz falsa com as consolações, que são sabores que vêm de Deus.
Um Conselho Salutar
Certa vez o Papa Francisco deixou um conselho muito importante para todos nós. Sabemos que seremos tentados e que o inimigo é mais esperto que nós. Por isso, não devemos dialogar com o demônio!
Estejam atentos, o diabo é um sedutor. Nunca dialogar com ele, porque ele é mais esperto do que nós e nos fará pagar. Quando a tentação vier, nunca dialogue! Feche a porta, feche a janela, feche o coração. Assim, nós nos defendemos dessa sedução, porque o diabo é astuto, ele é inteligente. [12]
É sempre bom recorrer a um sacerdote sábio para obter uma orientação em casos concretos. A nossa caminhada de Igreja não é individualista. Se achar que caiu em tentação, busque um confessor.
Que Nossa Senhora e São Miguel Arcanjo intercedam por nós!
Referências
[1] Catecismo da Igreja Católica, 391.
[2] Catecismo da Igreja Católica, 392.
[3] Garrigou-Lagrange. O Homem e a Eternidade: a Vida Eterna e a Profundidade da Alma. Campinas, SP: Ecclesiae, 2018. p. 114.
[4] Catecismo da Igreja Católica, 2483.
[5] Padre Scaramelli. Discernimento dos Espíritos. Campinas, SP: Ecclesiae, 2015. p. 83.
[6] Catecismo da Igreja Católica, 1013.
[7] Padre Scaramelli. Discernimento dos Espíritos. Campinas, SP: Ecclesiae, 2015. p. 83.
[8] Ibid, p. 84.
[9] Ibid, p. 84-85.
[10] Ibid, 85.
[11] Ibid, 86.
[12] Papa Francisco. Audiência Geral de 27 de Dezembro de 2023.