Hoje em dia, a humanidade vive uma grande contradição. A comunicação entre as pessoas tornou-se barata e veloz. Podemos, a qualquer momento, trocar mensagens eletrônicas com gente que está a quilômetros de distância.
Não é só a comunicação que se tornou fácil. As viagens também ficaram mais acessíveis. Há cem anos, por exemplo, viajar de um país a outro era uma empreitada de difícil retorno. Durava dias e até meses, a depender da rota.
O progresso tecnológico trouxe melhoras em algumas áreas da vida. No entanto, a qualidade dos relacionamentos humanos não melhorou. Muito pelo contrário, podemos até mesmo dizer que as pessoas se tornaram mais fechadas em si mesmas.
Todos podemos constatar como no nosso mundo, mesmo se estamos cada vez mais próximos uns dos outros com o progresso dos meios de comunicação, e as distâncias geográficas parecem desaparecer, a compreensão e a comunhão entre as pessoas muitas vezes é superficial e difícil. Permanecem desequilíbrios que com frequência levam a conflitos. [1]
O que será que aconteceu com a humanidade? Essa é uma pergunta bastante complexa, e nós não pretendemos respondê-la inteiramente aqui. Mas ela serve como pano de fundo para a nossa meditação.
Em um mundo cada vez mais desunido, a Igreja nos recorda que a fonte da sua admirável unidade é o Espírito Santo. Ele é alma da Igreja! Em Pentecostes, essa verdade brilha de modo especial.
O Pentecostes é a festa da união, da compreensão e da comunhão humana. [2]
Não somos nós que criamos a comunhão, mas sim o Espírito que age em nós. Neste artigo, vamos meditar sobre a ação do Espírito Santo na Igreja por meio do mistério do Pentecostes. Primeiro, você vai aprender o que era o Pentecostes no Antigo Testamento. Depois, veremos como a imagem da Igreja como Corpo de Cristo se vincula ao Pentecostes no Novo Testamento. Em seguida, vamos rever as quatro marcas ou notas da Igreja. Por fim, apresentaremos uma sugestão de meditação pessoal.
Uma Antiga Festa
Na época do Antigo Testamento, três festas litúrgicas foram instituídas (Dt 16, 16). Elas eram ocasiões de grande devoção, em que todos os homens de Israel peregrinavam a Jerusalém. Também Jesus participou com interesse nelas.
Os grandes acontecimentos da vida de Jesus estão em íntima relação com o calendário das festas judaicas; são, por assim dizer, acontecimentos litúrgicos, nos quais a liturgia, com as suas recordações e esperanças, torna-se realidade, torna-se vida, a qual conduz de novo à liturgia e a partir daqui de novo à vida. [3]
O Pentecostes era uma dessas três grandes festas da liturgia da antiga aliança. Sua data era móvel. A cada ano, a partir da Páscoa, contavam-se sete semanas para a celebração do Pentecostes (Lv 25, 16). Desse modo, coincidia com o período da colheita agrícola.
[O Pentecostes] era uma festa de celebração da colheita, comemorada cinquenta dias após a Páscoa, em que os pães da primeira safra de trigo da primavera eram dedicados ao Senhor (Lv 23, 15-17). [4]
Ao longo dos séculos, o Pentecostes foi adquirindo mais um sentido. O povo celebrava a entrega das Tábuas da Lei, com os Mandamentos de Deus, a Moisés no Monte Sinai. Esse foi o evento fundante da Antiga Aliança.
Com o tempo, esta celebração agrícola foi recebendo um significado teológico: tornou-se também uma festa da celebração da Torá, entregue ao povo de Israel no Monte Sinai. [5]
É importante conhecermos o sentido espiritual do Pentecostes porque foi nesta festa que Jesus derramou o Espírito Santo sobre os Apóstolos, iniciando um novo tempo para a humanidade. Na Antiga Aliança, a Lei de Deus estava inscrita em pedra; na Nova Aliança, ela habita no coração da Igreja.
Para os cristãos, o Pentecostes celebra a nova lei do Espírito (Rm 8, 2), escrita nos corações dos fiéis (Jr 31, 31-34; 2Cor 3, 4-6), que supera a Lei de Moisés, inscrita nas tábuas de pedra (Êx 31, 18). [6]
Até aqui vimos que o Pentecostes provém da liturgia do Antigo Testamento e que, nessa festa, ocorreu algo muito importante. Vejamos agora de perto o que foi.
Uma Comunhão Bem Concreta
Na Ascensão, o Senhor pediu aos Apóstolos que fossem a Jerusalém e lá permanecessem juntos. Eles obedeceram ao que Jesus lhes pediu e perseveraram com Maria na fé e na oração (At 1, 14).
Permanecer juntos foi a condição exigida por Jesus para receber o dom do Espírito Santo. [7]
A Igreja é um mistério de permanência, de comunhão. Ela é o Corpo de Cristo. Nos três anos em que conviveu com os Apóstolos, Jesus falou que assumiria um novo Corpo. Era uma fala surpreendente demais para eles entenderem. Por vezes, usou outra imagem: a do Reino. No dia de Pentecostes, no entanto, ficou claro que esse Corpo é a Igreja.

Assim como as células de um corpo formam uma nova vida humana quando Deus sopra a alma no embrião, assim também os apóstolos se tornaram o Corpo visível de Cristo quando o Espírito Santo veio a unificá-los. [8]
A imagem da Igreja como Corpo de Cristo evidencia que Ela não é um clube reunido em torno da memória de Cristo, mas sim uma unidade com Ele. A nossa comunhão se funda na ação do Espírito Santo que nos une a Jesus.
A comparação da Igreja com o corpo projeta uma luz sobre os laços íntimos entre a Igreja e Cristo. Ela não é somente congregada em torno dele; é unificada nele, em seu Corpo. [9]
São muitas as menções à Igreja como Corpo de Cristo nas cartas de São Paulo. Trata-se de uma metáfora dominante em seus escritos. Ela nos transmite a ideia de que a Igreja não é uma realidade desencarnada, meramente espiritual. Pelo contrário, a Igreja é bem concreta e pode ser encontrada.
Certas pessoas afirmam que essa “Igreja” é puramente espiritual ou que é uma realidade meramente figurativa. Mas isso não é o que Paulo quer dizer quando fala da Igreja como o “corpo” de Cristo. Pois um corpo é a parte visível de um ser dotado de alma. [10]
Essa concretude da Igreja é muito importante. Significa que a sua unidade é visível. A Igreja apresenta quatro marcas ou notas essenciais. Você sabe quais são elas?
Quatro Notas da Igreja
1. A Igreja de Cristo é Una
A Igreja não é obra humana. A sua unidade provém de ter um único fundador, o próprio Filho de Deus. Ela é una também porque o Espírito Santo é a sua “alma”. A unidade da Igreja através dos séculos e em meio a todos os povos é um grande mistério. A fé e os sacramentos são os mesmos, desde sempre.
Há um só corpo e um só Espírito, como também é uma só a esperança à qual fostes chamados. Há um só Senhor, uma só fé, um só batismo. (Ef 4, 4-5)
2. A Igreja de Cristo é Santa
Unida a Cristo, a Igreja é necessariamente santificada por Ele. Mas nós precisamos colaborar com a Graça. Não basta sermos católicos, temos que receber bem os sacramentos e conhecer a nossa fé. É preciso lutar dia a dia para crescer espiritualmente.
Maridos, amai as vossas mulheres, como Cristo também amou a Igreja e se entregou por ela. Pois ele quis apresentá-la a si mesmo toda bela, sem mancha nem ruga ou qualquer reparo, mas santa e sem defeito. (Ef 5, 25.27)
3. A Igreja de Cristo é Católica
“Católico” é um termo que tem dois sentidos. Em primeiro lugar, significa “completo”. A Igreja é católica porque tem a fé completa, como os Apóstolos deixaram. Preserva todos os sete sacramentos. Nada se perdeu; é católica! Em segundo lugar significa algo como “universal”. Ela é a única Igreja de todos os povos em todos os séculos, pois a sua missão é para todos.
Já não sois estrangeiros nem forasteiros, mas concidadãos dos santos e familiares de Deus. (Ef 2, 19).
4. A Igreja de Cristo é Apostólica
Com o auxílio do Espírito, a Igreja preserva e transmite tudo que os Apóstolos nos ensinaram. Ela se funda sobre os ensinamentos e as tradições dos Apóstolos, bem como conta com a sucessão apostólica desde o princípio (1Tm 4, 4; 5, 22).
Edificados sobre o alicerce dos apóstolos e dos profetas, tendo como pedra angular o próprio Cristo Jesus. (Ef 2, 20)
A Alma do Corpo
O Espírito Santo é a alma da Igreja. Ele não somente rege a Igreja, conduzindo-a pelos séculos, mas também habita nos corações dos fiéis. É por Sua ação que existe uma firme unidade na Igreja em meio à diversidade de dons e personalidades. O Espírito une todos entre si e a todos em Cristo.
O Espírito Santo que habita nos crentes, que plenifica e rege toda a Igreja, realiza esta admirável comunhão dos fiéis e os une tão intimamente em Cristo, que ele é o princípio da Unidade da Igreja. [11]
No dia de Pentecostes, depois das sete semanas da Páscoa, o Senhor apareceu entre os Apóstolos reunidos no Cenáculo e derramou sobre eles o Espírito Santo. A partir daquele momento, todos podem entrar no mistério da comunhão na Santíssima Trindade. Estamos no tempo da Igreja.
O Espírito Santo faz o mundo entrar nos “últimos tempos”, o tempo da Igreja, o Reino já recebido em herança, mas ainda não consumado. [12]
É uma grande graça ser Igreja. Neste momento, convém fazermos um exame de consciência. Como será que respondemos a esta eleição de Deus? Onde podemos melhorar? Será que a nossa vida dá testemunho de Cristo e Sua Igreja? Que a solenidade de Pentecostes seja um momento para meditarmos sobre a nossa resposta ao amor de Deus.
Que Nossa Senhora, Mãe da Igreja, interceda por nós!
Referências:
[1] Papa Bento XVI. Homilia da Solenidade de Pentecostes. 27 de maio de 2012.
[2] Ibid.
[3] Papa Bento XVI. Jesus de Nazaré: do Batismo no Jordão à Transfiguração. São Paulo, SP: Planeta, 2016. 2a. Edição. p. 262.
[4] Scott Hahn & Curtis Mitch. O Livro dos Atos dos Apóstolos - Cadernos de Estudo Bíblico. Campinas, SP: Ecclesiae, 2016. p. 30.
[5] Ibid, p. 30.
[6] Ibid, p. 30.
[7] Papa Bento XVI. Homilia na Solenidade de Pentecostes. 04 de junho de 2006.
[8] Fulton Sheen. Vida de Cristo. São Paulo, SP: Molokai, 2024. p. 1007.
[9] Catecismo da Igreja Católica, 789.
[10] Scott Hahn. Razões para Crer. Lorena, SP: Cléofas 2017. p. 84.
[11] São Clemente de Alexandria, Paed. 1, 6.
[12] Catecismo da Igreja Católica, 731.