Na época de Jesus, havia uma grande discórdia entre judeus e samaritanos. As causas eram antigas, e os dois lados se mostravam pouco dispostos à reconciliação. Chegavam a evitar o contato social uns com os outros.
Mas a atitude de Jesus era bem diferente. Ele não fez acepção de pessoas, nem deixou de falar a verdade com clareza. O Senhor veio para salvar a todos! É o que podemos perceber, por exemplo, na conversa entre Jesus e certa mulher samaritana no poço de Jacó.
Neste artigo, você vai aprender quem eram os samaritanos e por que havia tanta discórdia entre eles e os judeus. Depois, com essas referências, vamos ler juntos uma parte importante do diálogo entre Jesus e a samaritana. Em seguida, vamos esclarecer dois pontos sobre a salvação que Jesus nos traz.
Quem eram os samaritanos?
A origem dos samaritanos remonta ao tempo histórico em que Israel estava dividido em dois reinos, um ao sul e outro ao norte. Os assírios exerceram domínio político sobre o reino do norte e acabaram invadindo seu território.
Era o ano de 722 a.C. Depois de tomar a Samaria, o rei dos assírios deportou uma parte da população e enviou estrangeiros para habitar nela. A invasão seria lembrada por muitas gerações.
No ano nono do reinado de Oseias, o rei dos assírios tomou Samaria e deportou os habitantes de Israel para a Assíria. (2Rs 17, 6a)
A causa espiritual dessa tragédia é bem conhecida. Aqueles homens da Samaria haviam se afastado dos caminhos de Deus. Por mais que o Senhor os chamasse a mudar de vida, eles não se arrependiam nem voltavam atrás. A obstinação é causa de muitos males no mundo!
O Senhor tinha advertido Israel e Judá por meio de todos os profetas e videntes. Eles, porém, não prestaram ouvidos, mostrando-se tão obstinados como seus pais, que não tinham acreditado no Senhor, seu Deus. Passaram seus filhos pelo fogo. Praticaram adivinhações e magia e entregaram-se a fazer o que é mau aos olhos do Senhor, provocando-o. (2Rs 17, 13a.14.17)
Mas a história não acabou aqui. Depois da invasão, os sobreviventes tiveram que conviver com os estrangeiros que chegavam. O resultado foi que, ao longo do tempo, houve uma mistura de religiões.
E embora venerassem ao Senhor, prestavam culto também a seus próprios deuses, segundo os ritos das nações das quais foram trazidos para a Samaria. (2Rs 17 33)
Ao misturar religiões, aqueles homens distorceram a Revelação Divina. Em certo sentido, comprometeram a salvação de muitos. De que adianta Deus revelar a Sua vontade, se nós não acolhermos nem transmitirmos o que foi revelado com fidelidade? Na linguagem da Bíblia, aquilo era um tipo de adultério.
As cinco tribos estrangeiras que se misturaram com os israelitas do norte (samaritanos) introduziram cinco divindades masculinas em sua religião. Estes ídolos foram todos nomeados baal, palavra hebraica que significa “senhor” ou “marido”. Os profetas denunciaram Israel por servir a esses deuses, considerando essa idolatria uma infidelidade ao seu Esposo da Aliança. [1]
No tempo de Jesus, a inimizade entre judeus e samaritanos estava muito viva. Este é o pano de fundo da conversa entre o Senhor Jesus e a mulher samaritana, no poço de Jacó, que fica na Samaria.
Nos dias 05, 06 e 07 de maio o Padre Alex vai te ensinar a interpretar corretamente as Sagradas Escrituras no evento "A Profecia: Interpretando passagens do fim dos tempos". Se inscreva para participar clicando aqui!
No Poço de Jacó
Certa vez Jesus saiu da Judeia e retornou para a Galileia. Entre ambas as regiões, ficava a Samaria. Muitos judeus tomavam um caminho mais longo para evitar o contato com os samaritanos. Mas não foi o que Jesus fez!
Saiu da Judeia e voltou para a Galileia. Era preciso passar pela Samaria. (Jo 4, 3-4)
Como é bonito ver que Jesus não evitou os samaritanos! Ele teve misericórdia com aquelas ovelhas extraviadas e foi ao encontro delas. Quando chegou à Samaria, cansado da viagem, dirigiu-se ao poço de Jacó e sentou-se por perto. Era por volta do meio-dia. Aconteceu, então, algo surpreendente.
Veio uma mulher da Samaria tirar água. Jesus lhe pediu: “Dá-me de beber!” (Jo 4, 7)
Você percebe o que havia de tão surpreendente? É que, naquela época, não era nada comum que uma mulher fosse tirar água sozinha ao meio-dia. E era ainda menos comum que um homem judeu se dirigisse a uma mulher, sobretudo a uma samaritana. E mais: Jesus abordou aquela mulher pedindo-lhe um favor!

É natural que o Senhor estivesse com sede. Ele estava fatigado da viagem a pé, e a conversa aconteceu no calor do meio-dia. Mas a Sua sede não era apenas física. Ela tinha um sentido espiritual também. O Senhor tem sede da fé e do amor que podemos lhe dar!
A sede de Cristo é uma porta de acesso ao mistério de Deus, que se fez sedento para nos aplacar a sede, assim como se fez pobre para nos enriquecer (cf. 2 Cor 8, 9). Sim, Deus tem sede da nossa fé e do nosso amor. [2]
No princípio da conversa, a mulher não conseguia entender de que sede o Senhor falava. Para ela, tudo se resumia ao consumo de água. Mesmo assim, ela ficou intrigada com a atitude de Jesus.
Então, a mulher samaritana disse a Jesus: “Como é que tu sendo judeu, pedes de beber a mim, que sou samaritana?” (Jo 4, 9)
Foi então que o Senhor, partindo da realidade visível, falou do invisível. Aquela mulher só enxergava a água e o poço à sua frente, mas Ele apontou para além dos sentidos físicos. Fez uma menção ao mistério do dom de Deus.
Jesus respondeu: “Se conhecesses o dom de Deus e quem é aquele que te diz: ‘Dá-me de beber’, tu lhe pedirias, e ele te daria água viva.” (Jo 4, 10)
Apesar da dificuldade de entender, a mulher aceitou e pediu desta água! O Senhor lhe assegurou então que a água viva ia se tornar uma fonte que jorra para a vida eterna. Como não se lembrar do sacramento do batismo?
A tradição cristã associa a água viva à água do Batismo, que nos dá a vida eterna. Paulo descreve o Batismo como um “beber do Espírito” (1Cor 12, 13). [3]
Em seguida, o Senhor convidou aquela mulher ao arrependimento. Ela vivia em situação de pecado com um homem. Com delicadeza, o Senhor tocou neste assunto sensível no momento certo.
Disseste bem que não tens marido, pois tivestes cinco maridos, e o que tens agora não é teu marido. Nisso falaste a verdade. (Jo 4, 18)
A mulher precisava reconhecer seu pecado e confessá-lo. Não tenhamos vergonha de levar os nossos pecados ao confessionário. É preciso desobstruir os caminhos para que o Senhor passe.
As águas da Graça não podiam fluir por causa das pedras duras do pecado, das muitas camadas de transgressão, dos hábitos aterradores como o barro e dos múltiplos reservatórios de pensamentos carnais. Tudo isso tinha que ser cavado antes que ele pudesse beber da água viva. [4]
O próximo assunto da conversa foram as diferenças religiosas entre judeus e samaritanos. Respeitar as pessoas não significa fingir que tudo que elas fazem ou creem está correto. Com caridade, Jesus deixou claro que os samaritanos estavam no erro.
Vós adorais o que não conheceis. Nós adoramos o que conhecemos, pois a salvação vem dos judeus, mas vem a hora, e é agora, que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e verdade; pois são estes os adoradores que o Pai procura. Deus é Espírito, e os que o adoram devem adorá-lo em espírito e verdade. (Jo 4, 22-24)
Gostaríamos de chamar a sua atenção para dois pontos desta verdade que o Senhor nos revelou:
1.“A Salvação vem dos judeus”
Aqui Jesus fala de Sua missão. Ele, o próprio Jesus, é a salvação que vem dos judeus! Não era possível que o Salvador nascesse entre os samaritanos, porque Deus cumpre o que promete.
O cetro não será tirado de Judá, nem o bastão de comando de entre seus pés, até que venha aquele a quem pertence e a quem vai a obediência dos povos. (Gn 39, 10)
O Salvador nasceu na tribo de Judá. Quando o anjo anunciou a Maria, começou a “plenitude dos tempos” (Gl 4, 4). O longo período de preparação do Antigo Testamento estava concluído.
Israel era o canal pelo qual a salvação de Deus seria transmitida ao mundo. Era a árvore que havia sido regada por séculos e que agora dava a flor perfeita: o Messias e Salvador. [5]
2. “Em espírito e verdade”
Uma das diferenças entre judeus e samaritanos era o local de adoração. Para os judeus, Deus devia ser adorado no templo de Jerusalém; já para os samaritanos, no do Monte Gerizim. A própria samaritana havia mencionado esta divergência.
Os nossos pais adoraram sobre esta montanha, mas vós dizeis que em Jerusalém está o lugar onde se deve adorar. (Jo 4 20)
Jesus ensina que a adoração cristã será “em espírito”. Assim, ela não se restringe a este ou aquele local de adoração. A verdadeira adoração acontece na alma do fiel em estado de graça. Além disso, ela será “em verdade” porque vai estar livre dos erros dos samaritanos (a idolatria).
A adoração cristã difere da judaica e da samaritana. Será em espírito, não confinada em um único santuário, onde o sacrifício ritual de animais continuou desde o tempo de Moisés. Será também em verdade, não contaminada pelos erros de idolatria que moveram pragas aos samaritanos desde a divisão do reino. [6]
Uma Grande Alegria
O Senhor Jesus veio para salvar não somente a israelitas e samaritanos, mas também a toda a humanidade. É por isso que a Igreja não faz acepção de pessoas. Todos são convidados a entrar e perseverar nela.
É na Igreja que Cristo realiza e revela seu próprio mistério como a meta do desígnio de Deus: “recapitular tudo nele” (Gl 1, 10). [7]
Você sabia que, já em seus primeiros dias, a Igreja acolheu os samaritanos? São Pedro foi pessoalmente à Samaria, acompanhado de São João. Era uma confirmação de que todos têm lugar na Igreja.
Foi assim que Filipe desceu à cidade da Samaria, e começou a anunciar-lhes o Cristo. As multidões davam ouvidos àquilo que Filipe dizia. Unânimes o escutavam, vendo os sinais que fazia. Os apóstolos, que estavam em Jerusalém, souberam que a Samaria acolhera a Palavra de Deus e enviaram para lá Pedro e João. (At 8 5-6.14)
Essa experiência de reconciliação é para nós também. Não nos convém alimentar rixas nem discutir. Devemos nos abrir à reconciliação com os irmãos. Rezemos pela reconciliação dos que vivem em discórdia e pelo retorno dos afastados da verdadeira fé católica.
Você quer aprender mais sobre a Bíblia? Clique aqui e se inscreva para o evento "A Profecia: Interpretando passagens do fim dos tempos" com o Padre Alex Nogueira.
Referências:
[1] Scott Hahn & Curtis Mitch. O Evangelho de São João: Cadernos de Estudo Bíblico. Campinas, SP: Ecclesiae, 2015. p. 41.
[2] Papa Bento XVI. Angelus. 24 de fevereiro de 2008.
[3] Scott Hahn & Curtis Mitch. O Evangelho de São João: Cadernos de Estudo Bíblico. Campinas, SP: Ecclesiae, 2015. p. 41.
[4] Fulton Sheen. Vida de Cristo. São Paulo, SP: Ed. Molokai, 2024. p. 206.
[5] Ibid. p. 210.
[6] Scott Hahn & Curtis Mitch. O Evangelho de São João: Cadernos de Estudo Bíblico. Campinas, SP: Ecclesiae, 2015. p. 42.
[7] Catecismo da Igreja Católica, 772.