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Sinais de que estou fazendo a vontade de Deus

Se conhecemos a Deus e O amamos devemos ter uma vida reta, cumprindo Seus Mandamentos

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Deus deseja que cada homem e cada mulher alcancem a plena realização em sua humanidade. Para que essa realização se concretize, é vital que haja uma comunhão de vontades: a vontade do homem precisa estar em harmonia com a de seu Criador.

O próprio Jesus – Deus feito homem – nos ensinou essa verdade pelo exemplo de Sua vida: “Meu alimento é fazer a vontade daquele que me enviou” (Jo 4, 34), ou seja, o que sustentava a vida perfeitíssima de Jesus era unir a Sua vontade humana à do Pai Eterno.

Nossa jornada de conversão pessoal é, portanto, uma contínua busca para alinhar nossa vontade com a vontade Divina. As palavras de Nossa Senhora, “Eis aqui a serva do Senhor. Faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1, 38), e de São Paulo, “Eu vivo, mas já não sou eu; é Cristo que vive em mim” (Gl 2, 20), são expressões da mais profunda cooperação, onde a vontade humana se une à vontade de Deus, levando o homem à sua verdadeira realização.

Mas como discernir se estamos realmente fazendo a vontade de Deus? Essa pergunta nos leva a um caminho de exame interior e a um diálogo sincero com o Senhor, buscando os sinais de conformidade entre nossas decisões e os desígnios da Santíssima Trindade.

O Primeiro Passo para tomar boas decisões

Podemos discernir se estamos ou não fazendo a vontade de Deus por alguns meios. No entanto, antes de falarmos sobre eles, é necessário dar um primeiro passo na vida espiritual: estar em estado de graça.

De nada valeria entrarmos em um processo pessoal para identificar a vontade de Deus se não vivemos de acordo com os Seus Mandamentos. Obedecer a Deus significa cumprir a Sua vontade expressa em Sua Lei. Viver em conformidade com os Mandamentos é o princípio da vida espiritual e uma forma concreta de seguir a vontade de Deus.

Se conhecemos a Deus e O amamos devemos ter uma vida reta, cumprindo Seus Mandamentos (cf. 1 Jo 2, 3-4), tal como a Igreja nos ensina e esclarece. Portanto, se você é batizado e está vivendo em algum aspecto fora da lei de Deus, não perca tempo: rompa com o que o impede de comungar o Corpo do Senhor e busque o sacramento da confissão.

Meios para o discernimento da vontade de Deus

A seguir, apresentaremos alguns meios que podem nos ajudar a discernir melhor a vontade de Deus em nossa vida:

Oração

uma vida de oração diária permite-nos obter um coração desapegado das próprias vontades. Por ser um trato de amizade com alguém que nos ama [1], a oração nos torna mais dóceis às realidades espirituais e nos permite discernir a vontade de Deus: “Pela oração, podemos ‘discernir qual é a vontade de Deus’ (cf. Romanos 12, 2)”. [2]

Escutar a voz da consciência

São John Henry Newman disse a respeito da consciência:

[A consciência] é uma lei do nosso espírito, mas que o ultrapassa, nos dá ordens, e significa responsabilidade e dever, temor e esperança [...]. É a mensageira d’Aquele que, tanto no mundo da natureza como no da graça, nos fala veladamente, nos instrui e nos governa. A consciência é o primeiro de todos os vigários de Cristo”. [3]

Escutar a voz da consciência é, portanto, deixar-nos guiar pela lei Divina que está gravada nos nossos corações. Essa voz nos obriga a fazer o bem e evitar o mal. Além disso, nosso Anjo da Guarda nos auxilia nesse caminho, sussurrando suavemente em nossa consciência, como uma brisa, para que sigamos o caminho que Deus deseja.

Escutar as Escrituras

A Bíblia é uma bússola segura para quem busca viver segundo a vontade de Deus. Ao estudá-la sob a luz dos ensinamentos da Igreja e meditar em Sua Palavra, encontramos ensinamentos que nos orientam sobre o que é bom e agradável ao Senhor. Através das Escrituras, Deus nos fala diretamente e nos ilumina com a sabedoria necessária para tomarmos decisões.

Direção Espiritual

Um bom diretor espiritual, com sabedoria e experiência, pode nos oferecer uma perspectiva mais clara e madura a respeito da vontade de Deus. A direção espiritual nos ajuda a enxergar as situações da nossa vida sob a ótica da salvação, ajudando-nos a nos desprender das emoções que frequentemente nos dominam. Este acompanhamento nos guia na peregrinação da vida, permitindo-nos crescer na fé e entender mais profundamente os desígnios de Deus.

Observe as circunstâncias

Deus muito nos fala através dos acontecimentos. As circunstâncias de nossas vidas frequentemente servem como sinais da direção que Ele quer que sigamos. O nosso discernimento, então, envolve estar atento às portas que se abrem e se fecham ao nosso redor, às pessoas que se aproximam e às cruzes e alegrias que enfrentamos.

Por exemplo, no caso de um filho único que sente o chamado ao sacerdócio, mas teme pelas necessidades dos pais que passam por enfermidades e dificuldades financeiras. Ele precisará analisar o que as circunstâncias pedem para o momento. Percebendo como Deus se utiliza dessas situações e pessoas para nos ajudar no discernimento, ficará mais fácil unir a nossa vontade à d’Ele.

A dúvida: realidade muito presente

Um fato muito constante na vida do cristão é a dúvida sobre se estamos ou não fazendo a vontade de Deus. Muitas vezes nos deparamos com situações de grande complexidade e somos dominados por sentimentos contraditórios.

A dúvida, muitas vezes, nos fragmenta interiormente, roubando-nos a paz e gerando um conflito profundo em nosso coração. Em meio às incertezas, muitas pessoas acabam paralisadas, incapazes de agir, ou se deixam distrair por preocupações e questões secundárias, perdendo o foco daquilo que realmente importa: o que o Senhor nos pede.

Para lidarmos com questões como “Qual vocação seguir?”, “Que decisão tomar em um relacionamento?” ou “Como superar o medo que me paralisa?”, devemos, além de confiar na Providência Divina, estabelecer prioridades claras. Hierarquizar de forma objetiva os valores do Evangelho e nossas responsabilidades nos ajuda a discernir o caminho de Deus a seguir.

Santo Afonso, doutor da Igreja e fundador dos Redentoristas, escreveu muito bem sobre a união da nossa vontade com a de Deus [4]. Em linhas gerais, dentre tantos valiosos ensinamentos, ele diz que, quando estamos em dúvida, devemos escolher aquilo que mais glorifica a Deus e que está em maior conformidade com a caridade cristã. Ele também comenta que aceitar com amor as provações e dificuldades é um caminho seguro para cumprir a vontade de Deus.

Portanto, não devemos nos paralisar na busca pela vontade do Senhor. Devemos caminhar e dar passos concretos, porque Jesus nos quer inteiros, corajosos, fazendo da vontade d’Ele o nosso projeto de vida!

As incertezas podem ser para o nosso bem

Vale também dizer que, por vezes, Deus permite que sejamos consumidos pelas dúvidas como um meio de purificar nossa fé e amor por Ele. As incertezas que enfrentamos podem ser provações que nos moldam e fortalecem espiritualmente.

Muitos grandes santos passaram por momentos extremamente desafiadores em suas jornadas de fé. Alguns, inclusive, questionaram se suas vidas eram realmente fruto da vontade do Senhor ou apenas expressões de suas próprias mentes e vaidades.

São Francisco de Assis enfrentou momentos em que duvidou de sua vocação fundacional e teve dúvidas excruciantes sobre o futuro de sua ordem. Santa Teresinha, por sua vez, atravessou uma noite escura da alma, em que chegou a duvidar da própria existência de Deus. Ela experimentou o vazio existencial dos ateus, achando que toda sua devoção era uma fraude.

De qualquer forma, podemos aprender com as dúvidas e lutas dos santos como devemos proceder em nossa própria caminhada de fé. Apesar de suas incertezas quanto à vontade de Deus, eles se entregavam confiantemente à misericórdia e Providência Divina. Esse abandono, porém, não era passivo, mas cooperativo, marcado pela fidelidade na oração, na busca pelos sacramentos e em uma vida ativa de entrega a Deus e amor ao próximo.

Devido à profunda intimidade com o Senhor, cedo ou tarde, os santos compreenderam que fazer a vontade de Deus não significa ter todas as respostas claras e uma vida perfeita. É somente na fidelidade cooperativa, ao buscar a vontade de Deus de todo o coração, que somos gradualmente capacitados a viver na certeza do que verdadeiramente agrada ao Senhor.

Façamos como os santos: confiemos na orientação do Espírito Santo, sabendo que Deus está ao nosso lado em cada passo do caminho.

Sinais de que estou fazendo a vontade de Deus

Deus é amor, justiça, misericórdia e verdade. Quando nossas decisões refletem esses atributos Divinos, é um forte sinal de que estamos no caminho certo. São Paulo descreve os “frutos do Espírito” – amor, alegria, paz, paciência, afabilidade, bondade, fidelidade, brandura, temperança (Gl 5, 22-23) – como evidências de que uma pessoa está vivendo segundo o Espírito de Deus. Se nossas ações produzem esses frutos em nós e ao nosso redor, é um indicativo de que estamos em sintonia com a vontade Divina.

A seguir, apresentaremos alguns sinais que indicam que estamos verdadeiramente vivendo conforme a vontade do Senhor:

Fidelidade

Se suas escolhas promovem a fidelidade a Deus nas pequenas coisas do cotidiano, isso é um sinal de que você está fazendo a vontade de Deus. Cumprir com amor e dedicação a vida de oração, bem como as tarefas diárias, por menores que possam parecer, reflete um coração alinhado com os desígnios Divinos. A perseverança espiritual nas tribulações da vida é também um indicador.

Crescimento das virtudes

Você tem notado que está se tornando uma pessoa mais paciente? Tem agido com mais pureza, sem segundas intenções? O crescimento nas virtudes, especialmente a da Paciência e da Pureza, é um sinal claro de que você está avançando na santidade e, portanto, cumprindo a vontade de Deus.

Reflita: Tenho sido mais paciente? Tenho mantido a castidade não apenas em minhas ações, mas também em meus pensamentos e olhares? Meus sentimentos diante das falhas alheias são compassivos? Meus julgamentos têm sido misericordiosos?

Vontade de estar mais com Jesus

É um sinal de que a vontade de Deus tem acontecido em uma vida quando a pessoa tem cada vez mais vontade de estar com Jesus, de demorar-se com Ele na oração e, até mesmo, de contemplá-lo no cotidiano, nas pessoas, nos acontecimentos.

Harmonia entre a Humildade e a Magnanimidade

À primeira vista, essas duas virtudes podem parecer opostas, mas na realidade, se complementam.

A humildade nos leva a reconhecer nossa pequenez, nossas limitações e nossa total dependência de Deus, gerando em nós um desejo de escondimento e de servir no anonimato. Em contraste, a magnanimidade nos chama a grandes feitos, impulsionando-nos a buscar a excelência e a realizar ações que reflitam a grandeza de Deus. Essa virtude nos inspira a desejar os ideais mais elevados, a não nos contentarmos com a mediocridade e a dar o melhor de nós para levar Jesus a todas as almas.

A pessoa que vive conforme a vontade de Deus, tanto em suas decisões quanto em suas ações e reações, integra essas duas virtudes de forma equilibrada. A chave está em praticar a magnanimidade com humildade, reconhecendo que qualquer grande realização deve ser orientada para a glória de Deus, e não para a nossa própria exaltação, nem mesmo em busca do sucesso pastoral. A obra e seu resultado são sempre de Deus.

Paz

A paz interior, aquela que Cristo nos dá [5], é frequentemente um sinal de que estamos no caminho certo. Quando tomamos decisões em conformidade com a vontade de Deus, geralmente experimentamos uma paz profunda que transcende as circunstâncias, mesmo aquelas que nos causam tristeza. Essa paz é um fruto do Espírito e um indicativo nítido de que estamos cooperando com a vontade do Pai. Um exemplo disso é Nossa Senhora no Calvário. Apesar da dor inimaginável que enfrentava, a Virgem das Dores permaneceu plenamente obediente ao plano salvífico de Deus, abandonada no Pai e ancorada na entrega de seu Filho.

Alegria Profunda

Mesmo que as incertezas assombrem nossas mentes e o caminho se mostre difícil, exigindo sacrifícios, a alegria é um sinal do consentimento de Deus em nossa alma. Essa alegria é uma satisfação profunda que brota de dentro, independentemente das circunstâncias externas. Quando estamos na vontade de Deus, conseguimos plantar flores até nos buracos da estrada da vida, transformando as contrariedades em oportunidades de louvar a Deus por nossas escolhas e vocação.

Comunhão com a Igreja

Sendo “a Igreja de Deus vivo, coluna e sustentáculo da verdade” (1 Tm 3, 15), é fundamental que validemos nossa vida e escolhas à luz do seu Magistério. Pergunte-se: A vida que estou escolhendo está em conformidade com a doutrina da Igreja? Minhas ações e decisões estão levando as pessoas ao meu redor à conversão a Cristo e à Sua Igreja? Essas indagações nos ajudam a alinhar nossa vida com a verdade de Deus que a Igreja proclama, garantindo que nossas escolhas não apenas sejam corretas, mas também frutíferas para a edificação do Reino dos Céus.

Diante desses sinais e para discernir bem a vontade do Senhor, é crucial sermos objetivos em nossas decisões, analisando racionalmente os prós e contras de cada situação e escolha. Esse enfoque nos ajuda a tomar decisões de maneira mais segura, evitando que nossas escolhas sejam guiadas apenas por emoções ou impulsos momentâneos.

Coragem, irmãos! Confiemos sempre no Senhor! Tenhamos certeza de Seu amor! Ele nos sustentará a cada dia, se buscarmos de coração cumprir a Sua vontade.

Referências

[1] Santa Teresa d’Ávila disse no “Livro da Vida” que a oração é “um trato de amizade, estando muitas vezes tratando a sós com quem sabemos que nos ama”. (Livro da Vida, cap. 8).

[2] Catecismo da Igreja Católica, parágrafo 2826

[3] Joannes Henricus Newman, A Letter to the Duke of Norfolk, 5: Certain Difficulties felt by Anglicans in Catholic Teaching, v. 2 (Westminster 1969) p. 248.

[4] Sua principal obra sobre o tema é “Tratado da Conformidade com a Vontade de Deus”.

[5] Podemos ler sobre essa paz em São João 14, 27 e São João 20, 19-21.